Sexta, 13 de setembro de 2024

 


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por um princípio moral; era, antes de mais nada,
expressão do ressentimento de
a censura ter sido feita por outros.


nesta sexta,
a cesta do
j.p. da fontoura


TEXTOS DE
JOÃO PAULO
DA FONTOURA*







Duas figuras
maravilhosas



O ACRE E JOSÉ PLÁCIDO DE CASTRO


Sempre tive uma admiração por essa importante figura da história do nosso Brasil do período entre o final do século XIX e início do XX, e, igualmente,  interesse e curiosidade em relação aos meandros da história da anexação da daquele longínquo território (bem lá no Norte do Brasil),  à época pertencente à Bolívia, e que, diferente da afirmação raivosa e prenhe de mágoa do falecido ditador Hugo Chávez, ‘o Brasil nos roubou o Acre pelo valor de um cavalo’, o território nos custou uma boa grana quando, em finais de 1903, foi comprado graças às habilidades do Barão do Rio Branco e do nosso Assis Brasil, dois homens extremamente competentes no mister da negociação.
Na verdade, custou-nos até muito: dois milhões de libras esterlinas e mais algumas outras coisitas.

"Há na web um texto da historiadora Neidy B.M. de Albuquerque, sua tese de doutorado na USP  de 2015, muito bom, com o chistoso título ‘A cavalo dado não se olham os dentes, Bolivian Syndicate e a questão do Acre na imprensa.’. Aqui neste texto, não vou desenvolver as implicações que a ‘negociata’, típica de república bananeira, cometeu com um trust de investidores objetivando arrendar a região a esses capitalistas predadores. A decisão dos bolivianos, arriscada, inábil, e a repercussão negativa na imprensa, mudou a posição original do nosso governo e acabou por trazer o território acreano ao seio da nossa Pátria."


Como dito no caput do texto, sempre admirei José Plácido de Castro, e esta minha admiração aumentou exponencialmente quando, no início do namoro com minha esposa, visitando a casa dos sogros, encontro entre várias fotos que me são mostradas (na minha época era assim mesmo, tu eras obrigado a olhar um mar de fotos, e tinhas que sorrir!) veio-me uma do libertador do Acre. Na sequência, fiquei sabendo, sem muitos detalhes, que meu sogro, José Castro, era parente do Plácido de Castro. Depois, com a ajuda de uma tia professora (tia Terezinha, da minha esposa), consegui traçar toda a linhagem até alcançar o meu sogro, para alegria e orgulho de toda a família!


- Sempre achei o nome Acre muito belo e o relacionava com as incursões dos Cavaleiros do Templário nas cruzadas para resgatar Jerusalém e região dos (malvados) árabes/muçulmanos. Acre é uma cidade muito antiga, hoje pertencente a Israel e fica na região da Galileia. Que bom gosto a escolha deste nome tão belo, mas... não foi assim.
A origem é prosaica, produto de um erro de interpretação numa escrita de um endereço.
Um rico seringueiro de nome João Gabriel, estabelecido com barracão às margens de um daqueles inúmeros rios da região, de nome Aquiri (nome indígena),  solicita, via carta, ao Visconde de Santo Elias, grande comerciante de Belém, o aviamento de uma série de mercadorias.
Mercadorias separadas e prontas para ser embarcadas, e aparece uma dúvida: ‘não entendo esse nome: é o Rio A, A, A, parece Acri ou Acre.’
Mandam a mercadoria, esta chega ao destino, e o nome Acre pegou e ficou!

Uma rápida visita na formação do Acre,


A região que hoje chamamos de Acre começa a existir como potencial econômico, e a despertar então a cupidez das autoridades bolivianas, a partir de 1877.
Com a explosão do consumo de borracha na Europa e nos Estados Unidos a inóspita região (e seus seringais) torna-se um b atraindo  milhares de sertanejos nordestinos que fugiam da devastadora seca de 1877.

O entreposto por onde passam navios carregados desses retirantes com suas mulheres e filhos é o município de Belém do Grão-Pará. Dali esses retirantes seguem por tortuosos e larguíssimos rios que não se acabam, olhos extasiados na mataria quente, úmida, na água abundante, nos bichos novos. Trabalha-se muito e os tempos difíceis da permanente seca ficam para trás. Agora é a abundância, a cornucópia que parece eterna, a gostosa fartura. Mas, mato acima em direção oeste, a notícia de que as inúteis terras na divisa com o Brasil estão gerando uma verdadeira fortuna em exportação de borracha chega aos gabinetes dos burocratas que imediatamente calculam o quanto de impostos poderão arrecadar.

E a guerra inicia.

Legalmente, a terra, por um acordo de 1867, era Boliviana, mas havia num dos seus artigos uma escapatória aos brasileiros que era a possibilidade do uti possedetis, ou seja, quem chegar primeiro é dono. Já, poucos anos antes  do século XX, todas as margens do rio Acre estavam ocupadas por esse bravo povo nordestino, tudo apinhado de barracões e seringais.
Uma coisa era certa, eles não entregariam aos bolivianos sem briga.

É a guerra!

Sem o apoio do presidente Campos Sales, esses bravos seringueiros brigam contra o exército boliviano, mas uma briga desigual, com muitas derrotas e poucas vitórias.
A coisa muda quando nossos jornais começam a replicar notícias da Europa e Estados Unidos de que a Bolívia estaria arrendando o Acre  para um Sindicato de investidores americanos e ingleses, o chamado Bolivian Syndicate, que assumiria total controle da região, inclusive – vejam o absurdo – militar.
Este fato acima, mais o apoio, mesmo que velado, do novo presidente Rodrigues Alves, faz o jogo virar e rápido.
Então houve sobre a Bolívia uma pressão em duas frentes: militar e diplomática.
Na militar, entra em ação, em 6 de agosto de 1902, a convite dos líderes dos seringueiros e do governador do Amazonas, o gaúcho José Plácido de Castro que exigiu e obteve total autonomia para agir.

Agora era a Revolução Acreana.

Já em 24 de janeiro de 1903 (meros cinco meses) os bolivianos são vencidos. É proclamada a República do Acre.
Três dias depois,  o presidente Rodrigues Alves ordena a ocupação do Acre e, de certa forma, escanteia Plácido de Castro, agora um herói local e nacional.
O governo boliviano enfurece e ameça  guerra contra o Brasil. Então, entra em campo o duo máximo da diplomacia brasileira, o Barão do Rio Branco e o chanceler Assis Brasil.

Um cavalo muito caro,

Em 17 de novembro de 1903, Brasil e Bolívia assinam um acordo no qual o Brasil fica com a posse da região, pagando, entre outras compensações de somenos, o valor de dois milhões de libras esterlinas, algo próximo nos dias de hoje a um milhão de dólares, um cavalo muito caro, mas altamente vantajoso a nós: o Acre representa em termos de área aproximadamente 60% do tamanho do nosso Rio Grande do Sul, ou uma quase Santa Catarina.
No meu livro ‘1893 – A Soma De Todos Os Ódios’, à página 59, eu abro um espaço para descrever, na pessoa do personagem ‘velho Apa’, a participação do Plácido de Castro na Revolução Federalista de 1893:

(...) Guri, pelo teu olhar sei que estás muito interessado nas démarches dessa batalha. Mesmo assim, peço-te para dar um pequeno pulo na nossa história para te contar algo que vale apenas como curiosidade, nada mais. Os grandes, os famosos guerreiros da nossa grei tu já os conheces, pois já os citei alhures. Mas, guri, sempre tem alguém, um valente, um idealista que pela sua mocidade somente adquirirá fama posterior. Esse é o caso do grande ‘Libertador do Acre’, José Plácido de Castro. Este valente e irrequieto soldado, até mesmo, guri, por nossas idades próximas, eu tive o enorme prazer de ter convivido fraternalmente durante um curto período da guerra. Ele, quase um oficial, por não ter concordado com o grupo de cadetes e oficiais na Escola Militar que apoiavam o presidente Floriano, acabou ingressando nas tropas do general Joca Tavares como simples soldado. Acabada a guerra, guri, o soldado já era o ‘major’ Plácido de Castro. De personalidade irrequieta, forte, não aceitou a anistia do governo central e acabou seguindo para o centro do País e depois para o Alto Amazonas. O resto, guri, como pertence à História, creio que já certamente o sabes, não!?

Finalizando,

Finda a guerra, estabeleceu-se na região tornando um dos maiores seringalistas do Acre.
Lamentavelmente, José Plácido de Castro teve uma vida muito curta, pois foi assassinado em 1908, com meros 34 anos,  em Alto Acre, por inimigo de rixas políticas.
Justa homenagem: seu nome, em 2004, nos atos de comemoração dos 100 anos da celebração do Tratado de Petrópolis, foi incluído no Livro de Aço, também chamado de Livro dos Heróis da Pátria, preservado no Panteão da Pátria e da Liberdade Tancredo Neves – em Brasília.


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João Cândido,
o (gaúcho) Almirante Negro


Dias atrás, relendo algumas revistas História – da Biblioteca Nacional, e ainda com a alma machucada pela leitura dos três volumes do livro ESCRAVIDÃO, do genial historiador Laurentino Gomes, deparei-me com uma matéria assaz interessante, uma abordagem nova em relação ao episódio da Revolta da Chibata e do seu personagem central, o gaúcho João Cândido.


Lembrando, a Revolta da Chibata foi um motim naval no Rio de Janeiro, ocorrido entre 22 e 27 de novembro de 1910, em navios da marinha surtos na Baía da Guanabara. Foi o resultado direto do uso da chibata por oficiais navais brancos ao punir marinheiros negros e mulatos.
O abjeto uso da chibata, como forma de punição, era uma característica que a marinha brasileira havia herdado da marinha portuguesa do período colonial a partir de um código conhecido como Artigos de Guerra. 


É importante destacarmos que essa prática absurda de se punir alguém por motivos em sua grande maioria banais aproximava a nossa marinha dos cruéis corsários rapinadores que infestavam os mares de antanho e seus meios abomináveis de punir alguém (pirata) que ‘errava’
Essa forma de punição, de triste memória, era dedicada somente aos postos mais baixos da marinha, ocupados em sua maioria por negros e mestiços.


Alguns relatos afirmam que o gatilho da revolta ocorre quando de uma viagem em mares do Pacífico, próximo à costa do Chile, por um motivo não historiado, o marujo negro de nome Marcelino Rodrigues Menezes é punido com 250 chibatadas e sem direito a cuidados médicos.

Sinceramente, eu sou um dos que desconhecia o fato desse singular personagem do século XX (pra mim, um herói) ter nascido por aqui no nosso estado. Ele, durante os vários interrogatórios para identificar os culpados pela segunda revolta, mistificava sempre afirmando ser argentino nascido na província de Corrientes.
Até 22 de novembro de 1910 – a data que marca a Revolta da Chibata –, João Cândido Felisberto era apenas mais um entre os vários marinheiros negros da Armada Nacional (90% dos marinheiros eram negros ou mulatos) que navegavam pelo mundo e viviam intensamente a vida de marujos.

Certamente, num destes inúmeros portos do mundo, ele teve contato com a história da revolta dos marinheiros russos, ocorrida em 1905, no encouraçado Potemkim, a sementeira para a Revolução de 1917.

Nascido na fazenda Coxilha Bonita, em 1880, que ficava no então município de Rio Pardo, filho de pai forro e mãe escrava (João Felisberto Pires e Ignácia Cândida Pires), ainda jovem, beirando seus 16 anos, é enviado para o Rio de Janeiro seis anos após a queda do Império.
15 anos depois de sua chegada, João Cândido sacode a república justo na semana em que um novo presidente, Hermes da Fonseca, tomava posse.

"E vamos deixar bem claro, a eleição do Hermes da Fonseca em si – ele vence o baiano Ruy Barbosa – já foi algo que havia abalado os ainda não curados alicerces da política brasileira de então, pois era a volta dos militares ao poder."

João Cândido foi alçado ao posto de líder desse movimento que, como sabemos, exigia melhores condições de trabalho na armada e o fim da cruel punição pela chibatada.

Desse momento em diante, mais ou menos intensamente, seu nome passou a frequentar as principais páginas dos jornais e revistas no Brasil e, até mesmo, no mundo.

"A revolta, considerada a 1ª Revolta da Chibata, foi totalmente perdoada, anistiada pelo governo Hermes da Fonseca. Mas, parece não ter havido o cumprimentos dos acordos, houve uma 2º, e nesta a mão pesada do estado se impôs: torturas, fuzilamentos, massacres, prisões!"

A segunda revolta não teve êxito

"Redimido totalmente do episódio pela moderna e justa visão dos historiadores, o herói negro foi anistiado em 2008 pelo presidente Lula, virou estátua no Rio de Janeiro, documentários vários na TV, filme no cinema e, a meu ver, a mais bela e perene de todas essas necessárias homenagens – tema de música da dupla João Bosco e Aldir Blanc: O Mestre-Sala dos Mares. (Por favor, ouçam-na!)"


Por fim, Leonel Brizola, quando governador do nosso estado, premiou o herói negro com uma aposentadoria vitalícia.


Morreu, com 89 anos, em 1969 e seu corpo está no Rio de Janeiro. 


4 comentários:

  1. Excelente texto, muito bom ler a história assim. O Almirante Negro hoje, seria chamado de "lacrador"?!?? Falando nisso, o guri mimado agora está brigando com a Austrália. Ah, aqueles cangurus comunistas....

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  2. Tenho um livro desde sempre, chamado Território de Bravos. Narra, numa tom juvenil, a história de José Plácido de Castro. Sempre achei alguém sem o devido reconhecimento.

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  3. Brasileiros em geral são um bando de otários. "Valentes" nas redes sociais enquanto o país segue censura/ditadura mas não reagem. Depois ficam reclamando.

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