Sexta, 13 de janeiro de 2023

 

NÃO LEVE A SÉRIO
QUEM NÃO SORRI!

 



LEVO ESSE SORRISO
PORQUE JÁ CHOREI DEMAIS




Escreva apenas para




especial

Nesta sexta, uma cesta
de Nicolau Maquiavel! 



O filósofo do populismo de esquerda?
O fundador do cinismo político?
Na real, o mais importante 
pensador da história da política






Os homens têm menos escrúpulos em ofender quem se faz amar do que quem se faz temer, pois o amor é mantido por vínculos de gratidão que se rompem quando deixam de ser necessários, já que os homens são egoístas; mas o temor é mantido pelo medo do castigo, que nunca falha.


Eu creio que um dos princípios essenciais da sabedoria é o de se abster das ameaças verbais ou insultos.


O primeiro método para estimar a inteligência de um governante é olhar para os homens que tem à sua volta.  


Maquiavel

Nicolau (Niccolò di Bernardo dei Machiavelli) nasceu em Florença - na Toscana, Itália -, em 3 de maio de 1469. Foi um importante filósofo, além de  historiador, poeta, diplomata e músico.

É  fundador do pensamento e da ciência política moderna, pelo fato de ter escrito sobre o Estado e o governo como realmente são, e não como deveriam ser.

Com o choque de realidade causado pelas suas ideias sobre a dinâmica do poder, seus textos geraram uma ameaça aos valores cristãos vigentes, principalmente devido às análises do poder político da igreja católica contidas em "O Príncipe".

Já na literatura e teatro ingleses do século 17, foi associado diretamente ao Diabo por meio das referências caricaturais e do apelido Old Nick. Surgiu, aí, na visão do pensamento enganoso e da trapaça, o adjetivo maquiavélico nas línguas ocidentais.

O termo "maquiavélico" acabou surgindo para fazer referência aos atos imorais, desleais ou violentos que as pessoas utilizam para obter vantagem. No entanto, o próprio Maquiavel defendia a ética na política, o que faz o sentido pejorativo desse termo ser, de certa forma, uma definição injusta dos ideais de Nicolau. Sua maneira de impor as ideias era diferente do estilo dos cientistas naturais da época.

Maquiavel viveu a juventude sob o esplendor político da República Florentina durante o governo de Lourenço de Médici. Entrou para a política aos 29 anos de idade no cargo de Secretário da Segunda Chancelaria. Nesse cargo, Maquiavel observou o comportamento de grandes nomes da época e a partir dessa experiência retirou alguns postulados para sua obra. Depois de servir em Florença durante 14 anos foi afastado e escreveu suas principais obras. Conseguiu também algumas missões de pequena importância, mas jamais voltou ao seu antigo posto como desejava.

Como renascentista, Maquiavel utilizou-se de autores e conceitos da Antiguidade Clássica de maneira nova. Um dos principais autores foi Tito Lívio, além de outros lidos através de traduções latinas, e entre os conceitos apropriados por ele encontram-se o de virtù e o de fortuna.

Ele era o terceiro de quatro filhos de Bernardo e Bartolomea de' Nelli. Bernardo era jurista e tesoureiro de uma província italiana chamada Marca de Ancona. A mãe era próxima da nobre família de Florença. Sua família era toscana, antiga e empobrecida. Iniciou seus estudos de latim com sete anos e, posteriormente, estudou também o ábaco, bem como os fundamentos da língua grega antiga. Comparada com a de outros humanistas sua educação foi fraca, principalmente por causa dos poucos recursos da família.

Nicolau casou-se com Marietta di Luigi Corsim e teve seis filhos.

Não se sabe ao certo o que teria levado à escolha de Maquiavel para a chancelaria em 19 de junho de 1498. Alguns autores afirmam que ele teria trabalhado aí como auxiliar em 1494 ou 1495, hipótese contestada atualmente. Outros preferem atribuir a sua entrada à escolha de um antigo professor seu, Marcelo Virgilio Adriani, o qual ele teria conhecido em aulas na Universidade Pública de Florença e naquele momento era Secretário da Primeira Chancelaria.

A principal instituição de Florença nesse período era a Senhoria com diversos órgãos auxiliares como as duas chancelarias. A primeira chancelaria era responsável pela política externa e pela correspondência com o exterior. A segunda ocupava-se com as guerras e a política interna. No entanto, essas funções muitas vezes se sobrepunham e a autoridade da primeira chancelaria prevalecia sobre a da segunda.

Entre as funções exercidas por Maquiavel, estavam tarefas burocráticas e de assessoria política, de diplomacia e de comando no Conselho dos Dez, um outro órgão auxiliar da Senhoria.

A primeira de suas missões foi a de convencer um mercenário a continuar recebendo o mesmo soldo. Nesse momento, o governo da República de Florença desejava reaver o controle de Pisa que havia aproveitado a passagem de Carlos VIII para rebelar-se, de forma que, ao realizar essa primeira missão de forma satisfatória, foi enviado em julho de 1499 para negociar com Catarina Sforza, duquesa de Ímola e Forlì a renovação da condota de seu filho Otaviano e para tentar conseguir o auxílio dela com soldados e artilharia para a tomada de Pisa.

O governo de Florença contratara o filho da duquesa por 15 mil ducados sabendo-o mau estrategista militar e Maquiavel tinha como instruções, diminuir o soldo e conseguir tropas e munição para a retomada de Pisa. Ele conseguiu de forma satisfatória reduzir o soldo a 12 mil ducados e não comprometeu a cidade na defesa de Ímola e Forlì como queria Catarina.

A partir dessa primeira missão, escreveu o Discorso fatto al Magistrato dei Dieci sopra le cose di Pisa, de 1499, seu primeiro escrito político.


Entre 1502 e 1503, Maquiavel teve contato com César Bórgia, filho do papa Alexandre VI, um cruel e ambicioso mercenário.

César Bórgia (conhecido também como Duque Valentino), por volta de 1501 como mercenário da Igreja e filho do papa, vinha conquistando territórios na Toscana, como Faença, em 25 de abril. Acercou-se de Florença com seus exércitos e exigiu que a cidade se aliasse a ele, pagasse-lhe um tributo e mudasse seu governo para um mais favorável a si. Quando os florentinos, sem opção, estavam prestes a ceder, Luís XII de França pressionou César Bórgia que foi obrigado a levantar acampamento. Dirigiu-se para Piombino, conquistando-a facilmente e também Pésaro e Rimini, após o quê voltou para Roma.

César Bórgia percebeu que, com a aliança francesa, Florença seria um empecilho a seu plano de expansão e por isso solicitou o envio de representantes com os quais tratar de seus interesses. Para essa missão, em 24 de junho de 1502, foi enviado Francisco Soderini, tendo Maquiavel como secretário e auxiliar. Durante a ida, surpreendeu-os a notícia da conquista do ducado de Urbino pelo duque Valentino: ele pediu um reforço de artilharia para a cidade e quando este lhe foi enviado, voltou-se contra o ducado.

Chegadas as tropas francesas, os enviados puderam retornar. Após a retirada das tropas de Bórgia da Toscana, Maquiavel escreveu o Sobre o modo de tratar os povos rebelados da Valdichiana (1502), sua primeira obra sem relação com as atividades da Chancelaria, e foi neste período (22 de setembro de 1502) que ocorreu uma reforma na constituição florentina tornando o cargo de alferes vitalício. Ele era ocupado por Piero Soderini, de quem Maquiavel tornou-se próximo.

Nesse meio tempo, César Bórgia conquistou a seus próprios condotieri Città di Castello e Bolonha. Temendo o duque, estes se reuniram em Magione para conspirar contra ele. César Bórgia solicitou a Florença um embaixador para negociar uma aliança e enviaram-lhe Maquiavel, sem poderes de embaixador, em 5 de outubro de 1502, apenas com a incumbência de entregar os conjurados, afirmando que eles haviam convidado Florença para participar da conspiração, mas que esta havia se negado.

A 9 de dezembro, César Bórgia marchou para Cesena com a intenção de dar fim ao conluio. Lá, mandou prender seu lugar-tenente, Ramiro de Lorque, que apareceu morto no dia seguinte. Dirigiu-se para Pésaro e depois, para Fano, ordenando que Orsini e Vitellozzo Vitelli, dois de seus subordinados, conquistassem Senigália (26 de dezembro) aonde, juntamente com Oliverotto de Fermo deveriam aguardá-lo. Foi aí que, ao chegar com suas tropas, mandou prender e, mais tarde, executar os três. Desse acontecimento deu Maquiavel sua análise no escrito: Descrição da forma como procedeu o Duque Valentino para matar Vitellozzo Vitelli, Oliverotto da Fermo, o senhor Paolo e o Duque de Gravina Orsini (1503).

Pedindo ajuda florentina, mas sem esperá-la, partiu para conquistar Città di Castello, Perúgia, Corinaldo, Sassoferrato e Gualdo, de onde Maquiavel foi chamado de volta por ter sido nomeado um embaixador. Chegou a Florença em 23 de janeiro de 1508. Com a morte de Alexandre VI e tendo Júlio II se tornado Papa, César Bórgia perdeu seu apoio e veio a se enfraquecer.

Feito prisioneiro duas vezes, morreu lutando pelo exército de Navarra, mas a figura de César Bórgia ficaria marcada para Maquiavel como a do perfeito representante de seu príncipe.

Em 7 de novembro de 1512, Maquiavel foi demitido sob a acusação de ser um dos responsáveis por uma política anti-Médici e grande colaborador do governo anterior. Foi multado em mil florins de ouro e proibido de se retirar da Toscana durante um ano.

Para piorar sua situação, no ano seguinte dois jovens, Agostino Capponi e Pietropolo Boscoli, foram presos e acusados de conspirarem contra o governo. Um deles deixou cair involuntariamente uma lista de possíveis adeptos do movimento republicano, entre os quais estava o de Maquiavel, que foi preso e torturado. Para sua sorte, com a morte do papa Júlio II em 21 de fevereiro de 1513 e a eleição de João de Médici, um florentino, como Leão X, todos os suspeitos de conspiração foram anistiados como sinal de regozijo e com eles Maquiavel, depois de passar 22 dias na prisão.


Libertado, seguiu para uma propriedade no distrito de Sant'Andrea in Percussina distante 3,3 quilômetros da comuna de San Casciano dei Bagni, província de Florença.


Foi durante esse ostracismo e inatividade, o qual duraria até sua morte, que ele escreveu suas obras mais conhecidas: O Príncipe e os Discursos sobre a Primeira Década de Tito Lívio (1512-1517).


Foi também nesse período que conheceu vários escritores no Jardim Rucellai, círculo de literatos, e se aproximou de Francesco Guicciardini apesar de já conhecê-lo há tempos. Entre os escritos desse período estão o poema Asino d'oro (1517), a peça A Mandrágora (1518), considerada uma obra prima da comédia italiana,[21] e Novella di Belfagor (romance, 1515), além de vários tratados histórico-político, poemas e sua correspondência particular (organizada pelos descendentes) como Dialogo intorno alla nostra língua (1514), Andria (1517), Discorso sopra il riformare lo stato di Firenze (1520), Sommario delle cose della citta di Lucca (1520), Discorso delle cose florentine dopo la morte di Lorenzo (1520), Clizia, comédia em prosa (1525), Frammenti storici (1525) e outros poemas como Sonetti, Canzoni, Ottave, e Canti carnascialeschi.

Com a more de Lourenço II em 1520, Júlio de Médici, que depois tornou-se papa com o nome de Clemente VII, assumiu o poder em Florença. Ele via Maquiavel com melhores olhos que seus antecessores e o contratou como historiador da república para escrever uma História de Florença, obra à qual dedicaria os sete últimos anos de sua vida. Nesse mesmo ano, ele estava ocupado escrevendo A Arte da Guerra (1519-1520). E é a partir de uma viagem a trabalho a Luca que ele escreveu a Vita di Castruccio Castracani da Lucca (1520).

Após a queda dos Médici, em 1527, com a invasão e saque de Roma pelas tropas espanholas de Carlos I, a república instalou-se novamente na cidade com o restabelecimento do Grande Conselho anteriormente instituído por Savonarola. Maquiavel viu mais uma vez suas esperanças de voltar a servir à cidade serem desfeitas, pois havia trabalhado para os Médici e foi tratado com desconfiança pela nova república.


Poucos dias depois, ficou doente, sentindo dores intestinais. Morreu obscuramente em 21 de junho e no dia seguinte foi enterrado no túmulo da família na Basílica de Santa Cruz em Florença.

O Príncipe é o livro mais conhecido de Maquiavel e foi completamente escrito em 1513, apesar de publicado postumamente, em 1532.


Nunca foi sensata a decisão de causar desespero nos homens, pois quem não espera o bem não teme o mal.


Os homens esquecem mais rapidamente a morte do pai do que a perda do patrimônio.


Os que vencem, não importa como vençam, nunca conquistam a vergonha.



5 pontos para entender
o pensamento de Maquiavel


MARÍLIA MARASCIULO para Galileu

3 MAIO 2020

Atualmente, o mais aceito é que as reflexões de Maquiavel formaram as bases do pensamento realista da ciência política moderna, e a imoralidade atribuída a elas na verdade provém de uma interpretação descontextualizada. Mesmo assim, o termo “maquiavélico” se tornou um adjetivo usado para qualificar pessoas sem escrúpulos, traiçoeiras e sem respeito pelas leis morais.





1. Os fins justificam os meios

À primeira vista, a frase erroneamente atribuída a Maquiavel (ela não aparece em O Príncipe e em nenhum outro texto do filósofo) é a que melhor parece resumir seus pensamentos. Afinal, em sua obra mais conhecida o filósofo dissecou a política sem escrúpulos, mostrando que o que a move é a luta pela conquista e manutenção do poder. Não importa se para isso for necessário romper com valores morais impostos pela Igreja e pela sociedade, que não deveriam restringir a ação do rei ou do governante.

O que ele defendida, na realidade, é que na política a ética é utilitária e a moralidade deveria ser medida com base em atos que sejam úteis à coletividade, mesmo que com isso acabe ferindo valores individuais.

2. Virtude é mais importante que sorte

Um dos pontos mais centrais do pensamento de Maquiavel é a dicotomia entre virtude e sorte, ou “fortuna”. Um príncipe, ou governante, virtuoso é aquele que não necessariamente é pérfido, mas sabe conquistar seus favores para manter o poder e expandir o domínio sem depender do acaso. Na visão o filósofo, ser virtuoso é saber o momento certo de agir e de não fazer nada, sem deixar margem para a fortuna. Algumas interpretações enxergaram isso como ser diabólico ou ardiloso.

3. Crueldade bem usada

Sobrepor a virtude à sorte pode significar também ter sabedoria para ser mau quando necessário: Maquiavel defendia que, para salvar o Estado, um governante deveria saber “não ser bom”, mentindo ou parecendo piedoso se a situação exigisse, de modo a manter a segurança e o bem-estar de seu povo. A crueldade, nesses casos, seria justificável e bem usada.

4. É preferível ser temido que amado

O amor é um sentimento inconstante, visto que as pessoas são naturalmente egoístas e podem alterar sua lealdade quando bem entenderem — ou, nas palavras do próprio Maquiavel, o amor é mantido por vínculos de gratidão que se rompem quando deixam de ser necessários. Já o temor em ser castigado não pode ser ignorado com tanta facilidade e, portanto, não falha.

5. Razão de Estado

Todas as observações de Maquiavel tinham, no fundo, a intenção de mostrar que o objetivo da política era manter a estabilidade social e do governo a todo custo. Cabe lembrar que o contexto em que vivia era de guerras e disputas, em uma Itália fragmentada e com o poder muito ditado pela Igreja.


Como é perigoso libertar um povo que prefere a escravidão!


Mate se preciso for, mas alcance seu objetivo.


Os homens devem ser adulados ou destruídos, pois podem vingar-se das ofensas leves, não das graves; de modo que a ofensa que se faz ao homem deve ser de tal ordem que não se tema a vingança.




Ser amado ou temido (O Príncipe – CAP. XVII)

por Alexsandro M. Medeiros

É neste capítulo, que encontramos umas das mais célebres passagens de Maquiavel, segundo o qual, ao príncipe é desejável fazer-se amado e temido. Entretanto, como é difícil combinar ambas as coisas – afirma Maquiavel –, muitas vezes é preciso optar entre um ou outro. Nesta hipótese “é mais seguro ser temido do que amado, quando se tem de desistir de uma das duas”, isto porque “os homens têm menos receio de ofender a quem se faz amar do que a outro que se faça temer” (Príncipe, XVII). É que o vínculo de reconhecimento que mantém o amor é rompido toda vez que há interesse; ao passo que o temor é mantido pelo medo do castigo, que sempre está presente.

O ideal, segundo Maquiavel, é que o príncipe possa agir sempre sem artimanha e violência. “Cada príncipe deve preferir ser reputado piedoso e não cruel; a despeito disso, deve cuidar de empregar adequadamente essa piedade” (Príncipe, XVII). Isto, porém, nem sempre é possível. O príncipe deve parecer clemente, piedoso, fiel, humano, íntegro e religioso; e sê-lo, mas na condição de o não ser, quando necessário. Ao príncipe é necessário que tenha todas as qualidades acima citadas e que haja segundo as leis, pois qualquer um reconhecerá ser digno de louvor o fato de um príncipe possuir todas as qualidades consideradas boas. Mas a natureza humana é tal que não permite sua prática consistente. Em realidade, os homens são maus, perversos, cruéis; isto é o real. E o príncipe não poderá só querer ser bom, sob pena de incorrer em sua própria ruína, de não atingir seus mais altos objetivos.

            Maquiavel cita o exemplo de César Bórgia, na Romanha (Príncipe, XVII), como modelo de sucesso. Por outro lado, Cipião (idem) teve seus exércitos rebelados na Espanha, por sua bondade excessiva, por meio do qual ele concedeu mais liberdade do que seria conveniente à disciplina militar. Aqui, observa Maquiavel, foi o excesso de bondade e a falta de fama da crueldade que levou o exército a se rebelar contra Cipião, pois, sem a crueldade, jamais se terá como manter unido um exércit

Nos Comentários, Maquiavel volta a citar o exemplo de Aníbal e conclui: os homens são movidos ou pelo amor ou pelo medo. Nesse sentido, no exemplo de Aníbal, “o chefe temido consegue melhor obediência do que o que é amado”. Maquiavel indica que a crueldade bem empregada é superior ao excesso de bondade. A primeira traz “vantagens importantes”, caso o líder saiba empregá-la de modo eficiente (MANIERI, 2015, p. 134).

            Por estas e outras razões, o príncipe deve aprender a não ser bom pois, “quando um homem deseja professar a bondade, natural é que vá a ruína, entre tantos maus”, mas antes, é necessário que o príncipe “aprenda a ser mau, e que se sirva ou não disso de acordo com a necessidade” (Príncipe, XV). O príncipe “é muitas vezes forçado, para manter o governo, a agir contra a caridade, a fé, a humanidade, a religião (...) Procure, pois, um príncipe vencer e preservar o Estado. Os meios empregados sempre serão considerados honrosos e louvados por todos...” (Príncipe, XVIII).

O problema principal está na relação entre o bem e o mal. Se ambos sempre estão juntos e não é possível realizar o bem, sem perpetrar o mal, então este último deve ser monitorado e conduzido com firmeza [...] Por isso se o mal é algo inevitável ao exercício do poder, “não deve o príncipe receá-la” (MANIERI, 2015, p. 134).

            É válido aqui ressaltar uma vez mais que, se o príncipe não deve querer apenas ser bom, é porque os homens são maus e perversos, ou seja, Maquiavel trabalha com uma concepção pessimista da natureza humana, propensa ao mal. Por isso, o príncipe deve impor sua força mais pelo temor que pelo amo

            A questão antropológica em Maquiavel é o que leva o pensador florentino a afirmar que é melhor para o príncipe ser temido que amado (BIGNOTTO, 2008). Uma antropologia negativa que enfatiza o aspecto corruto da natureza humana, sua ingratidão, ambição, egoísmo, natureza dissimulada

            O governante deve escolher ser temido, em detrimento de ser amado, se tiver que fazer a opção entre ambos pois

a natureza humana faz com que o temor não seja esquecido pelos homens, pois o medo dele decorrente o faz recordar do mal que pode lhe ser causado. Quanto ao amor, devido ao fato de que o homem somente têm (sic) boas recordações do mesmo, quando este acaba por qualquer motivo, são esquecidas rapidamente (MAGALHÃES, 2015, p. 53).

            Ideia que é reforçada logo no início da obra Discursos sobre a primeira década de Tito Lívio (1982) como podemos ver nesta passagem

Todos aqueles que se ocuparam com o estudo da vida política, e a história está cheia de exemplos que os apOiam, concordam em dizer que quem quiser fundar uma república e lhe dar leis, deve pressupor que todos os homens são maus, e que usarão da maldade de seu ânimo todas as vezes que tiveram a ocasião (apud BIGNOTTO, 2008, p. 92).

            A ordem é impossível sem a coação e é por meio da força que o príncipe deve exercer seu poder se quiser conservar seu domínio. Nas deliberações em que está em jogo a salvação da pátria, não se deve ter qualquer consideração para com o justo ou injusto, o piedoso ou cruel, o louvável ou vergonhoso, há de seguir o caminho que salve a vida da pátria

A crueldade em Maquiavel está em função do bem público. Se ela for utilizada nesse sentido, então é justificada. Ao comentar sobre os erros da multidão e dos príncipes, salienta que os da multidão podem ser curados com palavras e com um bom exemplo; já os erros dos príncipes só a “espada” pode servir. Abertamente, Maquiavel aconselha o assassinato para remediar o mal, em seu aspecto negativo. Isso porque a crueldade desse péssimo príncipe “persegue todos os que considera inimigos do seu bem particular”. Por isso a má crueldade é aquela que é empregada em prol de um bem particular e não da causa pública (MANIERI, 2015, p. 134).


            O conflito aqui com a moral cristã é claro, pois, de acordo com esta moral, o melhor para o governante é ser amado, piedoso, bom. Para Maquiavel, no entanto, não é possível definir nenhuma destas características como algo que deva ser desejado pelo príncipe pois o que deve ser levado em consideração são as circunstância, ou seja, “Maquiavel entende que não é importante ter nenhuma dessas características a priori, e o que importa é o resultado a posteriori. Faz-se esta assertiva, pois para Maquiavel a verdade efetiva aparece no resultado a posteriori” (MAGALHÃES, 2015, p. 55). É no capítulo XV e no XVIII que Maquiavel demonstra como estes fatos se dão, ou seja, que “As coisas que parecem ser boas, como qualquer das virtudes cristãs podem gerar um resultado político que não seria o desejado, mas uma atitude contrária a moral cristã poderia ocasionar um resultado politicamente bom” (MAGALHÃES, 2015, p. 55).

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