Sexta, 5 de fevereiro de 2021

 

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especial

Nesta sexta, uma cesta 
de 
Pierre Bourdieu! 


O investigador da desigualdade


O trabalho dos dominadores é dividir os dominados.

Pós-moderno? É uma bobagem que não significa nada.


Aquilo que foi criado para se tornar instrumento de democracia direta não deve ser convertida em mecanismo de opressão simbólica.











Pierre Bourdieu (
Pierre Félix Bourdieu
 
nasceu em Denguin, França, em 1º de agosto de 1930. Faleceu em Paris, em 23 de janeiro de 2002.

De origem campesina, filósofo de formação, foi docente na École de Sociologie du Collège de France. Desenvolveu, ao longo de sua vida, diversos trabalhos abordando a questão da dominação e é um dos autores mais lidos, em todo o mundo, nos campos da antropologia e sociologia, cuja contribuição alcança as mais variadas áreas do conhecimento humano, discutindo em sua obra temas como educação, cultura, literatura, arte, mídia, linguística e política.

Também escreveu sobre a sociologia da Sociologia. A sociedade cabila, na Argélia, foi o palco de suas primeiras pesquisas. Seu primeiro livro, Sociologia da Argélia (1958), discute a organização social da sociedade cabila e, em particular, como o sistema colonial interferiu na sociedade cabila, em suas estruturas e desculturação.

Dirigiu, por muitos anos, a revista Actes de la recherche en sciences sociales e presidiu o Comitê Internacional de Apoio aos Intelectuais Argelinos, sempre se posicionado claramente contra o liberalismo e a globalização.

Ele ingressou em 1951 na Faculdade de Letras em Paris, na Escola Normal Superior e, em 1954, graduou-se em Filosofia, assumindo um cargo de professor secundário em Moulins, Allier. Após prestar o serviço militar na Argélia, assumiu, em 1958, o cargo de professor assistente na Faculdade de Letras em Argel, quando iniciou sua pesquisa acerca da sociedade cabila.

Em 1960, torna-se assistente de Raymond Aron na Faculdade de Letras de Paris e inicia estudos a respeito do celibato na região de Béarn. Ainda em 1960, integrou-se ao Centro de Sociologia Europeia, do qual tornou-se secretário geral em 1962.

Ao longo das décadas de 1960 a 1980, desenvolveu farta obra, contribuindo para a formação do pensamento sociológico do século XX. Na década de 1970, estendeu sua atividade docente a destacadas instituições estrangeiras, como as universidades de Harvard e Chicago e o Instituto Max Planck de Berlim.


Em 1982, ministrou aula inaugural (Lições de Aula) no Collège de France (instituição que três anos mais tarde se associou ao Centro de Sociologia Europeia), propondo uma "sociologia da sociologia", constituída de um olhar crítico sobre a formação do sociólogo como censor e detentor de um discurso de verdade sobre o mundo social.

Nesse sentindo, tal aula inaugural encontra-se com a ministrada por Barthes (A aula) e Foucault (A Ordem do Discurso), privilegiando a discussão acerca do saber acadêmico. É consagrado doutor honoris causa das universidades Livre de Berlim (1989), Johann-Wolfgang-Goethe de Frankfurt (1996) e Atenas (1996).

Na agenda teórica proposta à teoria sociológica contemporânea, alguns elementos merecem destaque: a releitura dos clássicos, a construção de conceitos e a postura crítica do intelectual diante de uma tomada de posicionamento político, os quais amalgamados em sua discussão sociológica.

Ao compor, por exemplo, a ideia de campo, Bourdieu dialoga com a ideia de esferas, proposta por Max Weber, e, ainda, com o conceito de classe social de Marx.

É possível entender o conceito campo como uma rede de relações, uma noção que assinala a autonomia de afluências e disputas internalizadas, um verdadeiro espaço estruturado de tomada de posições, em que os agentes inseridos nele estão em constante debate e concorrência pelos despojos e insígnias das vitórias desse processo.

Também, pode-se pensar em sua utilidade como uma chave de estudo das dominações e práticas específicas de um determinado espaço social. Esse espaço equivale-se a um campo específico – por exemplo, jornalístico, literário, econômico, cultural, educacional, científico, entre tantos outros –, no qual é demarcada a posição social dos agentes e onde eles também se revelam.

Bourdieu, permitindo ter seu pensamento rotulado, adota como nomenclatura o construtivismo estruturalista ou estruturalismo construtivista.

Essa postura consiste em admitir que existe, no mundo social, estruturas objetivas que podem dirigir, ou melhor, coagir a ação e a representação dos indivíduos, dos chamados agentes. No entanto, tais estruturas são construídas socialmente, assim como os esquemas de ação e pensamento, chamados por Bourdieu de habitus.

Bourdieu tenta fugir da dicotomia subjetivismo/objetivismo dentro das ciências humanas. Rejeita tanto trabalhar no âmbito do fisicalismo, considerando o social enquanto fatos objetivos, como no do psicologismo, o que seria a "explicação das explicações".

O momento objetivo e subjetivo das relações sociais estão numa relação dialética. Existem realmente as estruturas objetivas que coagem as representações e ações dos agentes, mas estes, por sua vez, na sua cotidianidade, podem transformar ou conservar tais estruturas, ou almejar a tanto.

A verdade da interação nunca está totalmente expressa na maneira como ela se nos apresenta imediatamente. Uma das mais importantes questões na obra de Bourdieu se centraliza na análise de como os agentes incorporam a estrutura social, ao mesmo tempo que a produzem, legitimam e reproduzem. Nessa perspectiva, é pertinente afirmar que ele dialoga com o Estruturalismo, ao mesmo tempo que pensa em que espécie de autonomia os agentes detêm. Bourdieu, então, se propõe a superar tanto o objetivismo estruturalista quanto o subjetivismo interacionista (fenomenológico, semiótico).

Bourdieu dedicou parte significativa de seus mais de 40 anos de vida acadêmica aos estudos no campo da educação, tendo exercido influência em gerações de intelectuais de diversas áreas, mas principalmente aos que se dedicaram a estudos sobre educação.[2] Inicialmente, tais estudos estiveram principalmente concentrados em demonstrar os mecanismos escolares de reprodução cultural e social e as “estratégias” do sistema escolar para diferentes agentes e grupos sociais.

O sociólogo sempre manteve uma concepção pessimista em relação à escola e ao sistema educacional, uma vez que ele entendia como uma grande ilusão afirmar que o sistema escolar é um facilitador da mobilidade social, quando, na verdade, na escola se demonstra como o ambiente onde todas diferenças de classes não são atenuadas e assim coopera com a conservação social. São essas noções que posteriormente fundamentam afirmações sobre a legitimidade das desigualdades sociais e meritocracia.



Obras


A Dominação Masculina, Rio de Janeiro, Bertrand Brasil, 1999.

Sobre a Televisão, Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1997.

O Senso Prático, Petrópolis, Vozes, 2009

A Reprodução: elementos para uma teoria do sistema de ensino, Lisboa: Editorial Vega, 1978

Questões de Sociologia, Lisboa: Fim de Século, 2003

O Que Falar Quer Dizer: a economia das trocas simbólicas, Algés: Difel, 1998.


A Economia das Trocas Simbólicas, São Paulo, Editora Perspectiva S.A., 2003

O Poder Simbólico, Rio de Janeiro, Bertrand Brasil, 1992.

As Regras da Arte: génese e estrutura do campo literário, Lisboa: Presença, 1996

Razões Práticas: Sobre a teoria da ação, Campinas, Papirus Editora, 1996

Razões Práticas: sobre a teoria da acção, Oeiras: Celta Editora, 1997

Contrafogos: táticas para resistir à invasão neoliberal. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998.

Meditações Pascalianas, Rio de Janeiro, Bertrand Brasil, 2001.

Contrafogos 2: por um movimento social europeu. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001.

A Produção da Crença: contribuição para uma economia dos bens simbólicos, Porto Alegre, Editora Zouk, 2001

As Estruturas Sociais da Economia, Lisboa: Instituto Piaget, 2001

Lições da Aula: aula inaugural proferida no Collége de France em 23 de abril de 1982. São Paulo: Ática, 2001.

Esboço de Uma Teoria da Prática, Precedido de Três Estudos de Etnologia Cabila, Oeiras: Celta Editora, 2002

O Amor Pela Arte: museus de arte na Europa e seu público, Porto Alegre, Editora Zouk, 2003

A Miséria do Mundo. Petrópolis: Vozes, 2003.

Esboço para uma Autoanálise, Lisboa : Edições 70, 2004

Para uma Sociologia da Ciência, Lisboa: Edições 70, 2004 (Trad. de: Science de la science et reflexivité)

Os Usos Sociais da Ciência: por uma sociologia clínica do campo científico. São Paulo: Editora UNESP, 2004.

Ofício de Sociólogo: metodologia da pesquisa na sociologia. Petrópolis: Vozes, 2004. (em colaboração com Jean-Claude Chamboredon e Jean-Claude Passeron.)


A Distinção: crítica social do julgamento, Porto Alegre, Editora Zouk, 2007.






Uma aula sobre Bourdieu



A maior parte das palavras de que dispomos para falar o mundo social oscilam entre o eufemismo e a injúria.




O investigador da desigualdade 

Texto de Márcio Ferrari, de 1º de outubro de 2008

Embora a maioria dos grandes pensadores da educação tenha desenvolvido suas teorias com base numa visão crítica da escola, somente na segunda metade do século 20 surgiram questionamentos bem fundamentados sobre a neutralidade da instituição. Até ali a instrução era vista como um meio de elevação cultural mais ou menos à parte das tensões sociais. O francês Pierre Bourdieu (1930-2002) empreendeu uma investigação sociológica do conhecimento que detectou um jogo de dominação e reprodução de valores.

Suas pesquisas exerceram forte influência nos ambientes pedagógicos nas décadas de 1970 e 1980. "Desde então, as teorias de reprodução foram criticadas por exagerar a visão pessimista sobre a escola", diz Cláudio Martins Nogueira, professor da Universidade Federal de Minas Gerais. "Vários autores passaram a mostrar que nem sempre as desigualdades sociais se reproduzem completamente na sala de aula." Na essência, contudo, as conclusões de Bourdieu não foram contestadas.

Na mesma época em que as restrições a sua obra acadêmica se tornaram mais frequentes, a figura pública do sociólogo ganhou notoriedade pelas críticas à mídia, aos governos de esquerda da Europa e à globalização. Ele costuma ser incluído na tradição francesa do intelectual público e combativo, a exemplo do escritor Émile Zola (1840-1902) e do filósofo Jean Paul Sartre (1905-1980).

Valores incorporados

O livro A Reprodução (1970), escrito em parceria com Jean-Claude Passeron, analisou o funcionamento do sistema escolar francês e concluiu que, em vez de ter uma função transformadora, ele reproduz e reforça as desigualdades sociais. Quando a criança começa sua aprendizagem formal, segundo os autores, é recebida num ambiente marcado pelo caráter de classe, desde a organização pedagógica até o modo como prepara o futuro dos alunos.

Para construir sua teoria, Bourdieu criou uma série de conceitos, como habitus e capital cultural. Todos partem de uma tentativa de superação da dicotomia entre subjetivismo e objetivismo. "Ele acreditava que qualquer uma dessas tendências, tomada isoladamente, conduz a uma interpretação restrita ou mesmo equivocada da realidade social", explica Nogueira. A noção de habitus procura evitar esse risco. Ela se refere à incorporação de uma determinada estrutura social pelos indivíduos, influindo em seu modo de sentir, pensar e agir, de tal forma que se inclinam a confirmá-la e reproduzi-la, mesmo que nem sempre de modo consciente. 

Um exemplo disso: a dominação masculina, segundo o sociólogo, se mantém não só pela preservação de mecanismos sociais mas pela absorção involuntária, por parte das mulheres, de um discurso conciliador. Na formação do habitus, a produção simbólica - resultado das elaborações em áreas como arte, ciência, religião e moral - constitui o vetor principal, porque recria as desigualdades de modo indireto, escamoteando hierarquias e constrangimentos.

Assim, estruturas sociais e agentes individuais se alimentam continuamente numa engrenagem de caráter conservador. É o caso da maneira como cada um lida com a linguagem. Tudo que a envolve - correção gramatical, sotaque, habilidade no uso de palavras e construções etc. - está fortemente relacionado à posição social de quem fala e à função de ratificar a ordem estabelecida. Para Bourdieu, todas essas ferramentas de poder são essencialmente arbitrárias, mas isso não costuma ser percebido. "É necessário que os dominados as percebam como legítimas, justas e dignas de serem utilizadas", afirma Nogueira.

Capital cultural

Outro conceito utilizado por Bourdieu é o de campo, para designar nichos da atividade humana nos quais se desenrolam lutas pela detenção do poder simbólico, que produz e confirma significados Esses conflitos consagram valores que se tornam aceitáveis pelo senso comum. No campo da arte, a luta simbólica decide o que é erudito ou popular, de bom ou de mau gosto. Dos elementos vitoriosos, formam-se o habitus e o código de aceitação social. 

Os indivíduos, por sua vez, se posicionam nos campos de acordo com o capital acumulado - que pode ser social, cultural, econômico e simbólico. O capital social, por exemplo, corresponde à rede de relações interpessoais que cada um constrói, com os benefícios ou malefícios que ela pode gerar na competição entre os grupos humanos. Já na educação se acumula sobretudo capital cultural, na forma de conhecimentos apreendidos, livros, diplomas etc.

Com os instrumentos teóricos que criou, Bourdieu afastou de suas análises a ênfase central nos fatores econômicos - que caracteriza o marxismo - e introduziu, para se referir ao controle de um estrato social sobre outro, o conceito de violência simbólica, legitimadora da dominação e posta em prática por meio de estilos de vida. Isso explicaria por que é tão difícil alterar certos padrões sociais: o poder exercido em campos como a linguagem é mais eficiente e sutil do que o uso da força propriamente dita.

Os sutis artifícios de perpetuação

Para Bourdieu, a escola é um espaço de reprodução de estruturas sociais e de transferência de capitais de uma geração para outra. É nela que o legado econômico da família transforma-se em capital cultural. E este, segundo o sociólogo, está diretamente relacionado ao desempenho dos alunos na sala de aula. Eles tendem a ser julgados pela quantidade e pela qualidade do conhecimento que já trazem de casa, além de várias "heranças", como a postura corporal e a habilidade de falar em público. Os próprios estudantes mais pobres acabam encarando a trajetória dos bem-sucedidos como resultante de um esforço recompensado. Uma mostra dos mecanismos de perpetuação da desigualdade está no fato, facilmente verificável, de que a frustração com o fracasso escolar leva muitos alunos e suas famílias a investir menos esforços no aprendizado formal, desenhando um círculo que se auto-alimenta. Nos primeiros livros que escreveu, Bourdieu previa a possibilidade de superar essa situação se as escolas deixassem de supor a bagagem cultural que os alunos trazem de casa e partissem do zero. Mas, com o passar do tempo, o pessimismo foi crescendo na obra do sociólogo: a competição escolar passou a ser vista como incontornável.

A globalização e os descontentes

Bourdieu tornou-se ideólogo e símbolo dos protestos contra a globalização econômica e cultural, sobretudo depois do lançamento, em 1993, do livro A Miséria do Mundo. Ele assumiu um papel ativo de apoio à greve do servidores franceses, em 1995 e 1996, por julgar que ela representava um sinal de resistência do espírito público contra as privatizações. Desde então, posicionou-se fortemente contra a tendência política neoliberal e todas as outras que considerava aparentadas a ela, incluindo a linha de moderação adotada pelos partidos de esquerda que chegaram ao poder na Europa. Grupos movidos por insatisfação semelhante à de Bourdieu amplificaram seus protestos durante a reunião da Organização Mundial do Comércio em Seattle, nos Estados Unidos, em 1999, dando origem ao Fórum Social Mundial de Porto Alegre. Com suas críticas a uma ordem que considerava excludente, Bourdieu centrou fogo contra os meios de comunicação, que acusava de renderem-se à lógica do comércio e produzirem lixo cultural em larga escala.




Organização do Trabalho Pedagógico


Crítico dos mecanismos de reprodução das desigualdades sociais, Pierre Bourdieu destaca em sua obra os condicionamentos materiais e simbólicos que agem sobre nós (sociedade e indivíduos) numa complexa relação de interdependência. Ou seja, a posição social ou o poder que detemos na sociedade não dependem apenas do volume de dinheiro que acumulamos ou de uma situação de prestígio que desfrutamos por possuir escolaridade ou qualquer outra particularidade de destaque, mas está na articulação de sentidos que esses aspectos podem assumir em cada momento histórico.

A estrutura social é apresentada por Bourdieu como um sistema hierarquizado de poder e privilégio, determinado tanto pelas relações materiais e/ou econômicas (salário, renda) como pelas relações simbólicas (status) e/ou culturais (escolarização) entre os indivíduos. Dessa forma, a diferente localização dos grupos nessa estrutura social deriva da desigual distribuição de recursos e poderes de cada um de nós.

Por recursos ou poderes, Bourdieu entende mais especificamente o capital econômico (renda, salários, imóveis), o capital cultural (saberes e conhecimentos reconhecidos por diplomas e títulos), o capital social (relações sociais que podem ser revertidas em capital, relações que podem ser capitalizadas) e por fim, mas não por ordem de importância, o capital simbólico (o que vulgarmente chamamos prestígio e/ou honra). Assim, a posição de privilégio ou não-privilégio ocupada por um grupo ou indivíduo é definida de acordo com o volume e a composição de um ou mais capitais adquiridos e ou incorporados ao longo de suas trajetórias sociais. O conjunto desses capitais seria compreendido a partir de um sistema de disposições de cultura (nas suas dimensões material, simbólica e cultural, entre outras), denominado por ele habitus.

A produção do gosto

Nas décadas de 60 e 70 do século passado, Bourdieu se envolve em uma série de pesquisas de caráter qualitativo e quantitativo sobre a vida cultural, sobre as práticas de lazer e de consumo de cultura entre os europeus, sobretudo, entre os franceses.

Dessas experiências de investigação Bourdieu publica, em 1976, uma grande pesquisa intitulada Anatomia do gosto. Mais tarde, essa mesma pesquisa passa a ser objeto do livro intitulado: A distinção – crítica social do julgamento. Nessas duas obras, Bourdieu e uma equipe de pesquisadores tentam explicar e discutir a variação do gosto entre os segmentos sociais. Isto é, analisando a variedade das práticas culturais entre os grupos, Bourdieu acaba por afirmar que o gosto cultural e os estilos de vida, ou as maneiras de se relacionar com as práticas da cultura estão profundamente marcadas pelas trajetórias sociais vividas por cada sujeito.

Mais especificamente Bourdieu afirma que as práticas culturais são determinadas, em grande parte, pelas trajetórias educativas e socializadoras dos agentes. Dito com outras palavras, Bourdieu afirma que o gosto cultural é produto e fruto de um processo educativo, ambientado na família e na escola e não fruto de uma sensibilidade inata dos agentes sociais.

Capital cultural incorporado

Bourdieu põe em discussão, dessa forma,  o consenso relativo à crença de que gosto e os estilos de vida seriam uma questão de foro íntimo. Para o autor, o gosto seria, ao contrário, o resultado de imbricadas relações de força poderosamente alicerçadas nas instituições transmissoras de cultura da sociedade capitalista.

Para fundamentar essa afirmação, Bourdieu argumenta que essas instituições seriam a família e a escola; seriam elas responsáveis pelas nossas competências culturais ou gostos culturais. A distinção entre esses dois tipos de aprendizado, o familiar e o escolar, refere-se a duas maneiras de adquirir bens da cultura e com eles se habituar. Ou seja, os aprendizados efetuados nos ambientes familiares seriam caracterizados pelo seu desprendimento e invisibilidade, garantindo a seu portador um certo desembaraço na apreensão e apreciação cultural; por sua vez, o aprendizado escolar sistemático seria caracterizado por ser voluntário e consciente, garantindo a seu portador uma familiaridade tardia com a produção cultural.

O descompasso educacional

A perspectiva crítica sobre a produção do gosto cultural nas sociedades capitalistas tem por princípio que todas as relações educativas e socializadoras são relações de comunicação. Isto é, a mensagem comunicativa, mais propriamente o conjunto de regras culturais disponibilizadas pela escola, sobretudo aquelas relativas às artes eruditas ou à cultura letrada dependem da posse prévia de códigos de apreciação.

Consequentemente, diria Bourdieu, em uma sociedade hierarquizada e injusta como a nossa, não são todas as famílias que possuem a bagagem culta e letrada para se apropriar e se identificar com os ensinamentos escolares. Alguns, os de origem social superior, terão certamente mais facilidade do que outros, pois já adquiriram parte desses ensinamentos em casa. Existiria uma aproximação e uma similaridade entre a cultura escolar e a cultura dos grupos sociais dominantes, pois estes há muitas gerações acumulam conhecimentos disponibilizados pela escola. Nesse sentido, o sistema de ensino que trata a todos igualmente, cobrando de todos o que só alguns detêm (a familiaridade com a cultura culta), não leva em consideração as diferenças de base determinadas pelas desigualdades de origem social. Bourdieu detecta então um descompasso entre a competência cultural exigida e promovida pela escola e a competência cultural apreendida nas famílias dos segmentos mais populares.

Em síntese, para Bourdieu o sistema escolar, em vez de oferecer acesso democrático de uma competência cultural específica para todos, tende a reforçar as distinções de capital cultural de seu público. Agindo dessa forma, o sistema escolar limitaria o acesso e o pleno aproveitamento dos indivíduos pertencentes às famílias menos escolarizadas, pois cobraria deles os que eles não têm, ou seja, um conhecimento cultural anterior, aquele necessário para se realizar a contento o processo de transmissão de uma cultura culta. Essa cobrança escolar foi denominada por ele como uma violência simbólica, pois imporia o reconhecimento e a legitimidade de uma única forma de cultura, desconsiderando e inferiorizando a cultura dos segmentos populares.





Luciano Trigo entrevista Pierre Bourdieu


- O senhor acha que o pensamento francês está em crise?

Pierre Bourdieu - Pode-se dizer que sim, mas essa crise faz parte de uma problemática maior da Europa em geral, que ê a multiplicação dos falsos intelectuais produzidos pelos meios de comunicação. Esses intelectuais "mediáticos" acabam prejudicando - ou ao menos ocultando - o trabalho dos verdadeiros pensadores. Eles tornam mais difíceis o pensamento e a ação pública de quem tem realmente algo interessante a dizer. Eu caracterizo a obra desses autores como fast thinking. Seus livros são exemplos de um pensamento superficial, descartável e cheio de jargões incompreensíveis. Nesse sentido, talvez a pior crise seja a da impossibilidade crescente de estabelecer um canal de comunicação eficiente com o grande público, de forma a transmitir os resultados das pesquisas sociais serias. Mas por que você perguntou isso?


- Nos anos 60 e 70 os intelectuais franceses eram muito mais atuantes...

Bourdieu - Existe efetivamente uma crise de idéias, uma falência da crença em algumas instituições... Os intelectuais de esquerda perderam suas ilusões relativas à idéia da revolução, por exemplo. Hoje é mais difícil lutar contra o poder porque ele se exerce de forma muito mais sutil. Mas é preciso reconhecer que existiam muitos intelectuais que eram falsamente engajados, homens que só com o tempo mostraram sua verdadeira face. 

- Poderia citar algum exemplo?

Bourdieu - Bernard-Henri Lévy é o pior deles, aquele que mais compromete o autêntico debate intelectual. O escritor Philippe Sollers também era falsamente revolucionário. Hoje ele é assumidamente um conservador radical e nacionalista. Os nomes que verdadeiramente importam na vida intelectual francesa não aparecem nos jornais e na televisão. Por exemplo, fala-se muito de Jean Baudrillard, mas muito raramente de Georges Dumézil, que é autor de uma obra infinitamente mais importante. Estamos vivendo um momento em que é preciso lutar acirradamente contra esses inimigos do pensamento.

- O senhor acredita no surgimento de uma nova utopia?

 Bourdieu - Acredito numa nova utopia desde que ela seja construída em bases mais realistas - o que não tem nada a ver com o trabalho supostamente niilista dos nomes que citei há  pouco. Os intelectuais midiáticos fazer renascer antigas tradições do pensamento para empregá-las de forma distorcida, como acontece com as ideias de Heidegger, que curiosamente construiu uma obra com uma atitude de permanente hostilidade em relação às ciências sociais. Para a construção de uma nova utopia, acredito que se deve buscar os ramos mais pragmáticos da filosofia.

- O que o senhor pensa do conceito de pós-moderno?

Bourdieu – É uma bobagem que não significa nada. Seus defensores constroem um grande discurso para justificar o fim dos grandes discursos, das grandes narrativas. É um conceito de uma banalidade extraordinária, da mesma forma que a ideia de que "morte do sujeito" esteve em moda anos atrás. São expressões que não querem dizer rigorosamente nada.

- Como o senhor vê o triunfo planetário do liberalismo e das leis do mercado?

Bourdieu - Esta é uma pergunta muito geral, e o mais importante são as questões específicas. São os intelectuais midiáticos que gostam de falar sobre qualquer assunto, indiscriminadamente. Por exemplo, talvez fosse mais fácil responder a uma pergunta sobre os testes nucleares franceses, um exemplo trágico do reacionarismo do governo, ou sobre os efeitos da ação do FMI nas economias da América Latina. Quanto a isto, existe um problema muito sério, que é o novo imperialismo econômico. No Terceiro Mundo, o fim das utopias socialistas deixou um vazio muito grande, criando uma situação desesperadora é urgente reconstruir as bases da sociedade nesses países, criando condições para a divulgação do conhecimento e surgimento maciço de oportunidades de trabalho.

- Mas a solução desses problemas não depende de uma reformulação de toda a ordem mundial?

Bourdieu - Sim, claro, e temos que trabalhar para isso. Eu participei recentemente de um seminário com representantes da África e da Europa Oriental sobre a nova ordem mundial. Uma das idéias levantadas foi a criação e o fortalecimento de grandes instituições jurídicas multinacionais, que promoveriam uma verdadeira internacionalização dos direitos. Em outras palavras, o que se propôs foi uma revalorização do conceito de internacionalismo, mas em novas bases, diferentes do internacionalismo comunista é necessário pensar na criação de novos modelos, mesmo que isso pareça muito complicado.

- Desde a morte de Sartre, há  15 anos, não surgiu na França nenhum "maitre-à-penser"...

Bourdieu - São os intelectuais midiáticos e os jornalistas que dizem isso - porque, naturalmente, eles próprios não são "maitres-à-penser". É preciso levar em conta que o modelo sartriano de intelectual engajado correspondeu a uma etapa diferente da vida cultural francesa e sobretudo a uma etapa diferente da relação entre os intelectuais e os meios de comunicação. Muitas ações políticas de Sartre, ou mesmo de Michel Foucault, foram bem sucedidas porque contaram com um enorme apoio da imprensa. Hoje o espaço máximo que Sartre teria num jornal seria o de um artigo na página de opinião, porque os intelectuais midiáticos exercem uma espécie de monopólio da mídia. Suas obras são sem interesse, mas eles estão sempre dispostos a falar qualquer bobagem sobre qualquer assunto. Aliás, até mesmo Sartre disse muitas besteiras.

- Fale sobre o seu trabalho no Parlamento Internacional dos Escritores.

Bourdieu - Esta entidade existe justamente para tentar mudar esta situação. É uma tentativa de se criar uma Internacional dos Escritores. Mas é um trabalho muito difícil, porque escrever é uma atividade solitária, e por outro lado existem pessoas que querem participar apenas para aparecer. E fundamental combater o narcisismo. Por exemplo, lembro-me que muitos anos atrás Gilles Deleuze, Georges Dumézil, Alain Robbe-Grillet e eu escrevemos um manifesto protestando contra a situação na Polônia, mas decidimos que o texto não seria lido por nenhum de nós, mas por um ator. Hoje, uma das principais atividades do Parlamento é proteger escritores que são perseguidos politicamente.

- O senhor escreveu ensaios profundos sobre a educação nos anos 70, com "A Reprodução", A situação piorou ou melhorou desde então?

Bourdieu - Piorou muito, porque o governo francês não deu nenhuma atenção ao que eu escrevi na época, e já  estamos sofrendo as conseqüências disso.

- Em livros como "A economia das trocas simbólicas" o Senhor faz análises penetrantes das transformações da vida cotidiana. Na esfera privada, o senhor acredita que hoje as pessoas são mais conservadoras do que 20 anos atrás?

Bourdieu – É outra pergunta muito geral e sou obrigado a responder: eu não sei. Os intelectuais precisam ter a coragem de dizer "eu não sei", sobretudo diante de perguntas muito gerais, que não levam a nada. Para encerrar esse assunto, faço constar um episódio que me aconteceu. Um dia, Fernand Braudel procurou-me perguntando se eu gostaria de ajudá-lo a escrever um volume sobre o século XX, com o qual concluiria uma gigantesca pesquisa histórica. Pediu-me que dividisse minha reflexão em temas muito gerais, como o fim da religião, o renascimento do individualismo, etc. Então eu impus uma condição. Aceitaria fazer parte do projeto desde que pudesse escrever que eu não sabia todas as respostas. Apresentaria as grandes questões, mas as deixaria em aberto quando não soubesse como interpretá-las de forma satisfatória.

- Ele concordou?

Bourdieu - Sim, mas pouco tempo depois Fernand Braudel morreu, e o trabalho acabou não sendo feito.

- Acabou de ser lançado no Brasil seu livro "Livre troca : diálogos entre ciência e arte" e em breve será  lançado "As regras da arte" sobre a obra de Baudelaire. Como o senhor caracteriza a sua abordagem sociológica da arte?

Bourdieu - Minha preocupação principal em meus ensaios sobre á arte é analisar o que legitima social e culturalmente o gasto artístico de uma determinada época, ou seja, como a dominação econômica e social de uma classe também se manifesta culturalmente. As classes dominantes obtém, através de gostos de violência simbólica, a adesão das classes dominadas aos seus próprios critérios estéticos. Procuro também contextualizar historicamente a produção artística, fugindo dos clichês da inspiração e da genialidade. Não quero dizer com isso que um artista não dispõe de nenhum grau de autonomia. Baudelaire, por exemplo, subverteu completamente a tradição da literatura de sua época, e em As regras da arte eu tento explicar como isso foi possível.


2 comentários:

  1. Agora entendi porque a Glória Pires fez tanta questão de dizer que não era mãe do Fiuk.

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  2. Bourdieu,
    '...Minha preocupação principal em meus ensaios sobre á arte é analisar o que legitima social e culturalmente o gasto artístico de uma determinada época, ou seja, como a dominação econômica e social de uma classe também se manifesta culturalmente.'

    Os estudos e pensamentos deste escritor e pensador explica claramente o porquê do explendor da Florença, na idade média, época do mandonismo e despotismo da família Médice, banqueiro e mercadores que, inclusive, fizeram dois papas, um, Leão X, claramente homossexual! Gastavam fortunas protegendo pintores, escultores enquanto defenestravam (literalmente ) seus inimigos pelo poder!!!

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