Quinta/Sexta, 6 e 7 de março de 2025

 



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nesta sexta,
a cesta do
j.p. da fontoura

TEXTOS DE
JOÃO PAULO
DA FONTOURA*






MAIS UM CARNAVAL
QUE PASSOU...


Nasceu Maria quando a folia
Perdia a noite, ganhava o dia
Foi fantasia seu enxoval
Nasceu Maria no carnaval...

 Inserto da letra da (lindíssima) música ‘Maria, Carnaval e Cinzas’, de 1968, composição de Luiz Carlos Paraná.






Caras e caros leitores desta cesta cultural, literária e histórica: hoje, depois de discorrermos nas últimas semanas sobre os eventos e personagens, os principais,  da Segunda Guerra Mundial, um pouco de amenidade, carnaval.

 

Nesta quarta-feira de cinzas, acabou mais um carnaval, a festa máxima da nossa brasilidade, uma forte marca da multifacetada diversidade cultural e étnica brasileira, exagerando, como diria um desses sociólogos e antropólogos  engajados – a essência da identidade do Brasil.

Quando se diz acabou, na realidade esse ‘acabou’é apenas uma expressão stricto sensus, pois, todos sabemos, da metade do Brasil pra cima, a festa continua avançando o resto da semana, e, às vezes, por inércia, alcança até mesmo a(s) semana(s) próxima(s).

 

O que exatamente seria o carnaval, ou qual o espírito que moveu a cristandade nesse sentido, por que a data é móvel?

Uma das coisas que mais desagradam os brasileiros é a questão da data do carnaval, a qual, a cada ano – que coisa chata!,  é mobile.

Acontece que esse evento está diretamente ligado à páscoa que varia entre 22 de março e 25 de abril. A páscoa (e o carnaval por gravidade), é um evento móvel, uma combinação do calendário solar e lunar. Na realidade o carnaval ocorre sempre 47 dias antes da páscoa. Esta, neste 2025 deverá ocorrer no dia 20 de abril, num domingo (não fiz as continhas, mas deve bater).

Vamos fixar: a páscoa é o primeiro domingo após a primeira lua cheia que ocorre após o equinócio de março. Equinócio de março é um fenômeno que ocorre quando a Terra fica perpendicular ao Sol, marcando o início do outono no Hemisfério Sul (Brasil dentro) e da primavera no hemisfério Norte.

 (Alguém, ingênuo como eu, que nada entendo da exegese cristã, poderá perguntar: ‘Por que eles não fixam uma data  - 20 de abril por exemplo -, e param com este absurdo que faz com que o nosso carnaval varie tanto?’

Bem, aviso-vos: não há a menor chance. A Igreja jamais cederá numa questão que para ela é dogmática, pronto! Hoje, ufa!, até podemos questionar e nada nos acontecerá, mas,  no passado, vide o incauto astrônomo Giordano Bruno, fogueira para os perguntadores importunadores hereges.)


Carnaval é um período de festas, bailes e desfiles em salões ou em vias públicas que acontece antes da quarta-feira de cinzas.

O termo, etimologicamente, pode ter vindo da expressão latina carne vale (adeus à carne) ou mesmo do italiano carne levare (remover a carne). Ambos dizem quase a mesma coisa, ou seja: a carne está proibida – jejum – visto a chegada da Quaresma.

 

Há várias explicações para definirmos o carnaval e sua origem ou origens, desde as festas de Isis e Ápis no Egito Antigo, passando por festejos dos hebreus (festa das sortes), dos bacanais dos gregos antigos, das saturnais dos antigos romanos, chegando aos gauleses (franceses), venezianos e outros povos europeus, e até mesmo ao mítico Mardi Gras (terça-feira gorda), o carnaval americano do norte, basicamente em Nova Orleans, que (falem mal dos baianos...) dura mais de mês.



 

No nosso caso particular, o ‘Carnaval Brasileiro’, o carnaval das antigas marchinhas, dos pierrôs, dos arlequins, das colombinas, serpentinas, confetes, máscaras, dos salões lotados, das avenidas transbordando de foliões, das sempre presentes transmissões dos desfiles nas avenidas via redes de TVs, tem origem lá atrás, trazido pelos portugueses como um movimento chamado entrudo, uma espécie de brincadeira popular, que foi se modificando e adquirindo algumas das características das festas européias.

Iniciou, essencialmente popular, com as pessoas mais humildes, principalmente negros escravos. Com o tempo, passou aos salões das elites (bailes de máscaras), mas nunca deixou os espaços e suas práticas eminentemente populares.

Com o tempo, início do século XX, miscigenou-se ao emergente samba. Durante muito tempo as marchinhas e os sambas imperavam nos salões, nas ruas e nas rádios.

Hoje, lamentavelmente, as marchinhas definharam para praticamente não mais existirem. Uma pena! Que saudade das ‘Abra Alas’, da Chiquinha Gonzaga; ‘Mamãe eu quero’, do Jararaca, da dupla com o Ratinho, que alguns dizem ser a música brasileira mais conhecida no mundo; ‘Cachaça não é água’, do Trigueiros Filho; ‘Cabeleira do Zezé’, do João Roberto Kelly (hoje, chance zero de o autor não ser cancelado ad aeternum); Sassaricando, do Candeias Júnior; Me dá um dinheiro aí, do grande Moacir Franco; e tantas ouras...



 

Não há como negar-se: carnaval, como evento popular, pra valer mesmo, é Brasil puro.

Levas e levas de turistas do mundo todo chegam aos aeroportos do Rio, Bahia, Pernambuco, já embalados por várias doses de uísques servidas à bordo, descem ofegantes, saracoteando seus corpos com olhares cupidos às nossas mulheres e...  não entendem nada: como?, cadê as mulheres peladas?, todos de ternos, vestidos, opa, venderam-nos o quê.

 

Eu não tenho dúvida de que carnaval e futebol são as duas – disparadas – mais importantes festas populares do Brasil.

Mas não são unanimidades e nem mesmo chegam perto disso.

Eu adoro futebol de, às vezes, iniciar vendo um jogo da Liga Inglesa às 15 horas e só sair da frente da tela lá pela meia-noite quando acaba a transmissão do jogo do meu Inter no brasileirão.

Mas carnaval – puxa vida, tenho até pudor em afirmar, mas, por favor, não de cancelem, ODEIO, não suporto! Se me obrigam a ficar cinco minutos em frente da TV vendo um desfile, entrego até a minha mãe!

O que eu curto no carnaval é a sua história, é a antropologia que há por trás, é o fenômeno popular.

Por que fenômeno? Simples: o carnaval divide meio a meio a população brasileira, entre amor absoluto e incondicional e ódio absoluto e incondicional.

Um exemplo de amor incondicional: há um padre de uma das paróquias de São Leopoldo (o sacro) que cancelou toda sua agenda de compromissos, marcou voo, e está indo ao Rio curtir os desfiles das Escolas de Samba (o profano).

 

Do ponto de vista sociológico e antropológico, entendo que a festa ‘carnaval’ é uma espécie de catarse humana, um ritual de reversão, tanto que são inúmeros os brasileiros, de intelectuais às pessoas mais simples, que afirmam com senso de humor que o Brasil só começa depois do carnaval.



 

É aí, nos salões, nas avenidas que o pedreiro negro se fantasia de feitor, que a moça pobre veste-se à madame; que ricaço da cidade sai de mendigo, que um homem comum sai travestido de mulher!

 

Também temos a questão das normas de comportamento – que em regra são afrouxadas quando não suspensas totalmente.

Há um livro que li, uns 30 anos atrás, o Perfume, do escritor alemão Patrick Süskind (também saiu filme no cinema e no Netflix) em que o personagem é um perfumista que busca o sumo perfume extraído do corpo de meninas que são mortas por ele. Lá pelo final, este perfumista é preso, julgado e condenado à morte com todo o ritual de maldades das execuções do século XIX. Quando vai sendo conduzido à praça da execução, o assassino consegue retirar de suas vestimentas um vidrinho com gotas do ‘perfume’. Ele esparge à multidão que o rodeia e as pessoas entram num tresloucado delírio, é a bestialidade humana: o juiz pega a filha do carteiro, arranca suas roupas e ... É pai com filha, irmão com irmã, mãe com... Orgia geral. Ao limite, exagerando, não se assemelha a algo que conhecemos?

 

Na antiguidade, as pessoas mais místicas consideravam o inverno (estamos falando do hemisfério norte) como um reino de espíritos maus que precisavam ser expulsos para que o verão dos bons espíritos voltasse. Então, antropologicamente, podemos dizer que o carnaval é uma espécie de rito de passagem, um festerê, um vale tudo festivo, o celebrar a fertilidade, a festa primeira do ano entrante.

  

Finalizando, só como curiosidade, pois há um evidente exagero na pregação, abaixo vou colocar a fala da Joana Prado, a ex-feiticeira, 47 anos, agora uma casta senhora evangélica convicta – ou seja, tem partido – extraído da web:



 

O Carnaval não é apenas uma festa inofensiva. Ele carrega consigo uma cultura que, muitas vezes, promove tudo o que é contrário à vontade de Deus — imoralidade, excessos, idolatria e um afastamento dos princípios bíblicos. Como cristãos, somos chamados a viver de maneira santa e separada do mundo. Paulo nos adverte: 'Todas as coisas me são lícitas, mas nem todas convêm; todas as coisas me são lícitas, mas eu não me deixarei dominar por nenhuma'. O Carnaval pode até parecer só uma festa, mas será que convém para alguém que foi comprado pelo sangue de Cristo?

Nosso chamado é para sermos luz do mundo e sal da terra, não para participarmos das trevas. Isso não significa que devemos ser legalistas ou viver apontando o dedo, mas sim que devemos ter discernimento espiritual e buscar agradar a Deus em tudo. Que possamos usar esse tempo para nos aproximar mais do Senhor, fortalecer nossa fé e, quem sabe, até evangelizar aqueles que estão presos nesse ciclo de engano. Afinal, a verdadeira alegria não está em festas passageiras, mas na presença de Deus".

É isso aí, pessoal!

 *joão paulo da fontoura é escritor e historiador diletante, membro da ALIVAT – Academia Literária do Vale do Taquari, titular da cadeira nº 26.