Quinta, 19 de dezembro de 2013

DIÁRIO DE UM ET

Fernando Albrecht
(www.fernandoalbrecht.com.br)

Querido diário. Ainda não estou bem aclimatado no planeta Terra e portanto só posso registrar estupefações. E como as tenho! Por determinação do Império Galáctico estou numa cidade chamada Porto Alegre, que fica no estado mais meridional de um conjunto de estados chamado Brasil. Que povo estranho. Por esta época eles preparam uma festa chamada Natal, cuja noite principal é dia 24, quando fazem troca de presentes.

Habito o corpo de um humano. Quando cheguei neste aglomerado urbano ainda com meu escudo de invisibilidade, escolhi morar em um adulto com vestes coloridas cor de laranja, que me pareceu ser pessoa importante na hierarquia. Com meu chip despejando informações no cérebro, descobri que estas pessoas se chamam gari. Não gostei, porque em seguida me vi empurrando um carro com rodas – eles ainda não descobriram a levitação – com um pedaço de pau cheio de cerdas na ponta, que eu devo usar para limpar o leito das ruas.

Assim que recarregar meu chip com informações novas vou habitar outro corpo. Eu pensei que aquele pedaço de pau fosse uma espécie de estandarte e que o veículo retangular que eles empurram – eles ainda usam polímeros – era uma mesa de jogos. Pior é que a população não parece gostar muito deles, porque nem mesmo os cumprimentam.

Descobri que a festa de Natal é uma reunião de famílias onde os adultos bebem e comem e dão presentes para as crianças não encherem o saco deles (aprendi essa frase hoje, não sei bem onde entra na história esta parte do corpo humano). O mais estranho é a figura central do Natal, uma espécie de pai falso chamado Noel com um gorro ridículo, que se veste com peles próprias para temperaturas abaixo de zero numa estação em que faz bem mais de 30 graus Celsius de dia.

Há muitos deles por toda a cidade. Mas deve ser uma espécie em estágio primitivo porque nem mesmo sabem falar, além de ho-ho-ho. Todavia devem ser primatas alegres, estão sempre rindo. Também por esta época eles comem muito uma massa chamada panetone, que eu descobri ser italiana – nada a ver, de novo. O sabor é estranho, e após analisar essa massa borrachenta deduzi que os humanos deveriam usá-lo para cobrir os buracos nas ruas. Nem usinar precisa, é deitar direto.

Termino por hoje, querido diário. Voltarei quando estiver em outro corpo.


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