Terça, 28 de outubro de 2014 - parte 2



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ponto especial



UM POLEMISTA DE VERDADE






Fiquei muito triste com um post do professor Deonísio Da Silva ( reproduzido pela médica Laís Legg, no Facebook) sobre a morte do jornalista e escritor Janer Cristaldo, no domingo passado.
O último parágrafo da nota de Deonísio:
Grande Janer! Foi sempre um intelectual inquieto, culto, de vastas leituras, autor de livros muito bem escritos, tradutor de Ernesto Sabato, de autores suecos, franceses etc. Vão fazer falta suas pertinentes e polêmicas intervenções.
Foi, sem dúvida, um grande polemista. Escreveu na década de 70 na Folha da Manhã, diário do doutor Breno Caldas. Desde então, não surgiu outro cronista com a sua capacidade. Posso dizer que o Juremir Machado, por exemplo, tem em comum com Janer a cidade de nascimento - Santana do Livramento. Não só o Juremir, todos.
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Andou pelo mundo. Era Doutor em Letras pela Sorbonne, formado em Direito (detestava) e filosofia. Seu maior sucesso literário foi escrito quando morava na Suécia, "O Paraíso Sexual Democrata" - confira em http://www.ebooksbrasil.org/eLibris/paraisosexual.html.
Quando saiu de Porto Alegre, teve uma rápida passagem por Florianópolis, onde foi professor na Universidade. Morava em São Paulo, onde escreveu para todos os jornalões. Nos últimos anos tinha o cristaldo.blogspot.com.br e o último post é de 5 de setembro deste ano.
Janer estava com aquela doença que me nego a escrever. Conta Deonísio:
Minha filha Manuela e eu o visitamos há alguns dias no Hospital Samaritano, em São Paulo. Sem voz, falou apenas por gestos, meneios da cabeça e palavras proferidas com o movimento dos lábios. Pareceu muito contente com nossa visita, apertou nossas mãos e nos ouviu com atenção, entendendo tudo o que lhe dizíamos.
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Conheci o Cristaldo quando escrevia para a Folha.
A Companhia das Letras havia encomendado para o Caio Fernando de Abreu uma seleção de novos escritores gaúchos, para o livro "Assim Escrevem os Gaúchos - Inéditos". E eu fazia parte deste grupo. Sei lá o motivo, a tarefa foi transferida para o Janer. Um dia ele me chamou e disse que estava mantido.
Já imaginou? Andava nas nuvens. Selecionado pelo Caio e pelo Janer.
Mas o livro não saiu.
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Sempre o acompanhei pelos jornalões em que escrevia.
Até que há uns anos descobri o seu blog e, a partir daí, reproduzi muitos de seus textos.
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Quando comecei a pesquisar para o livro "Apaixonados por Porto Alegre - Personagens do Centro", conversei com o jornalista Rogério Mendelski, amigo do Janer.
Tinha pouco material sobre um dos personagens, Carlos Ducatti. E o Rogério me diz:
- O Janer era amigo dele e deve ter algum texto sobre o Ducatti.
Mandei um email pra ele, dizendo o que fazia e que reproduzia os seus textos. Ao final perguntei sobre o Ducatti. Bah, o cara foi de uma gentileza inesquecível. Quis saber quem eram os outros personagens e inclusive contribuiu com muitas informações.
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Me mandou um texto sobre o Carlos Ducatti, que reproduzo. Está no livro "Apaixonados por Porto Alegre - Personagens do Centro":


O SNI, ÓVNIS E O HOMEM DE ORION

Porto-alegrenses de minha idade certamente lembrarão de Carlos Ducatti, o cientista, filósofo e poeta orionino. Ou orionano, não lembro agora. Ele não era terráqueo. Viera da nebulosa de Orion e tinha uma missão na Terra. Seguidamente eu o encontrava no Chalé da Praça XV e certa vez tivemos uma longa discussão sobre o que era ser orionino ou orianano. Não lembro agora como ele se definia. Mas havia uma substancial diferença entre um e outro conceito.
Ora, vivíamos em uma cultura na qual milhões de pessoas acreditam na existência de uma mãe virgem. Por que eu não aceitaria então que ele viera de Orion? Nunca pus em dúvida suas origens e, a cada vez que o encontrava, perguntava como estava a temperatura em Orion.
Ducatti fundou o Clube dos Sábios, que congregava sete pessoas, sendo uma delas sua mãe. Considerava que a mulher é prejudicial ao gênio. Só não seria prejudicial em uma circunstância: durante a relação, o homem deveria liberar um só espermatozóide. Interrogado por uma jornalista como isto seria possível, respondeu com um piscar de olhos:
- Questão de prática.
Pasmem! Foi de Ducatti que ouvi falar pela primeira vez a teoria dos buracos negros. Ele os conhecia muito antes de Stephen Hawking. Andava em busca de Galactus, ser galático que odiava a vida e se alimentava de planetas. Galactus fora, inicialmente, uma ilação teórica. Com o correr do tempo, sua existência passou a ser um imperativo de ordem conceitual, única explicação plausível para o desaparecimento de civilizações cósmicas multimilenares.
Até hoje, guardo em meus arquivos os panfletos nos quais Ducatti explicava seus projetos. Um deles era o esquema de uma complexa máquina matapardais. O Homem de Orion julgava que os ditos predadores tinham qualquer ligação com os poderes do mal, sem falar que não lhes suportava o chilreado. E os bichinhos eram legião em torno ao Chalé, particularmente na primavera. A máquina consistia basicamente em uma metralhadora giratória acoplada a quatro canhões sonoros e a um computador com gravação dos sons de pardais em sua memória. Ao ouvi-los, os canhões direcionais apontavam a arma para a fonte de emissão de ruídos e a metralhadora era acionada automaticamente. Havia pensado em uma arma à base de raios laser, mas sua filosofia ecológica não permitia sacrificar árvores.
Um outro projeto era uma proposição para viver com menos de um salário mínimo, com 33 itens, entre os quais se destacavam: não ter carro, televisão, aspirador, batedeira, etc., coisas perfeitamente dispensáveis; ser autodidata, evitar pagar cursos; acostumar o estômago a exigir pouco alimento; botar pouco açúcar no chá; fritar ovos com água; não seguir a moda, coisa irracional que nos impele a fazer compras; não fazer seguros, confiar no cósmico e na fraternidade; ir de preferência a espetáculos grátis; em caso de esgotamento nervoso, ir ao campo (as clínicas são caríssimas); não fumar; não comprar boné contra o sol: andar pela sombra ou proteger-se com um jornal; não estragar os tênis ou sapatos jogando futebol; não comprar quadros, pintá-los; ter letra pequena, afim de economizar papel. Etc.
Em um outro prospecto, fazia uma crítica ao filme Guerra nas Estrelas, a partir de suas experiências astrais. Vinte seriam as falhas do filme, entre elas o fato de todas as estrelas aparecerem iguais, desprezando-se as diferenças de tamanho, distância e cor; mesmo em satélites, a gravitação é igual à da Terra; entre os extra-terrestres há muitos tipos monstruosos, cerca de oitenta por cento, quando o normal seria quinze; a invisibilidade de naves e pessoas, recurso muito usado por seres evoluídos, jamais ocorre; pessoas supostamente evoluídas alimentando-se com pratos e talheres, quando seres adiantados ingerem só líquidos ou prana.
Alimentava o projeto UNAT - União das Nações da Terra - com sede em Brasília, para substituir a ineficiente ONU. Seu principal objetivo, a busca inteligente e objetiva das soluções para os problemas humanos, sendo uma das primeiras tarefas resolver a questão palestino-israelita. E planejava a construção de um espaçoporto em Porto Alegre, para receber os óvnis de galáxias distantes. Egresso do curso de Física da UFRGS, era tido como um louco manso. Creio que só eu acreditava piamente em suas viagens astrais.
Certo dia, quase tive uma eclampsia. Eu voltava das Ilhas Canárias. Na Gran Canária, estive no povoado de Arucas. Percorrendo sua geografia, encontrei uma espécie de oásis, algo como um mar sereno de areia em meio a montanhas pontiagudas. Lembrei do Homem de Orion e disse à minha Baixinha: “se os extras chegam à Terra, só pode ser aqui que eles aterrissam. Preciso comunicar ao Ducatti.” Encontrei-o no Chalé, como sempre.
- Ducatti, estive em Arucas, na Gran Canária. Acho que é lá que os extras aportam.
- Sei disso – respondeu o Homem de Orion -. Já escrevi ao prefeito de Arucas.
E puxou do bolso uma carta, a resposta do prefeito de Arucas. É nestes momentos em que minha descrença vacila. Profundo mistério!
Dito isto, leio hoje na Folha de São Paulo que o extinto SNI (Serviço Nacional de Informações) durante muito tempo pôs seus agentes à espreita dos óvnis, segundo documento de 86 páginas, obtido pelo jornal e classificado como confidencial.
Um objeto luminoso, que fazia evoluções em alta velocidade sobre a parte frontal da cidade de Colares [no Pará]" foi visto pelo menos duas vezes, há pouco mais de 30 anos, nos dias 16 e 22 de outubro de 1977. "A forma do objeto era cilíndrica, quase cônica", diz um relato pormenorizado. Um desenho rudimentar dessa suposta espaçonave interestelar completa a descrição do episódio.
(...)
Em meados de 1977, os jornais do Pará e do Maranhão traziam insistentes relatos sobre "luzes misteriosas, causadoras de mortes e alucinações". Pessoas em contato com o fenômeno apresentavam sintomas de "paresia [paralisia incompleta] generalizada, hipetermia, cefaleia, queimaduras superficiais, calor intenso, náuseas, tremores do corpo, tontura, astenia [fraqueza] e minúsculos orifícios na pele". A Aeronáutica não titubeou. Mobilizou homens e recursos para uma missão. Num ato de humor involuntário, batizou a empreitada para buscar discos voadores com o nome autoexplicativo de Operação Prato, segundo relato do SNI.
(...)
Os agentes se dividiam em turnos. Faziam vigílias noturnas até o dia amanhecer em lugarejos pouco povoados. O documento do SNI é apenas um extrato do que está na Aeronáutica e permanece em segredo. O esforço dos "observadores" militares às vezes resultava em nada. Por exemplo, no dia 27 de outubro de 1977:
"1h15 - Observadores instalados no alto da caixa d'água";
"4h05 - Populares observam o deslocamento de uma intensa "luz" ao nível das árvores (Roberto), informam aos observadores postados na caixa d'água (30 a 40 m de altura) ao nível do topo das árvores, nada observado. Restante do período, nada a relatar".
Quando raiava o dia, descanso. Sucessivos relatos dos militares da Operação Prato começam assim: "6h30 - descanso até as 14h".
Eles dormiam de dia e trabalhavam à noite. Algumas vezes, a intensa atividade celeste no turno da noite levava o descanso a se estender até as 15h.
E por aí vai. Segundo a Folha, o documento do SNI sobre a missão da Aeronáutica interessada nas coisas do espaço sideral só se tornou público graças a um pedido da CBU (Comissão Brasileira de Ufólogos). Com base em direito garantido pela Constituição do Brasil, os ufólogos pediram acesso a documentos sobre óvnis guardados pelas Forças Armadas e outros órgãos oficiais do governo federal. O requerimento foi protocolado na Casa Civil da Presidência em 26 de dezembro de 2007.
Em 31 de outubro passado, dez meses depois, chegaram as primeiras 213 páginas de papéis antigos e confidenciais da Aeronáutica. São datados de 1952 a 1969. Na última quinzena do mês passado apareceu o relatório de 86 páginas do SNI, relativo à Operação Prato, de 1977 e 1978.

Ora, o SNI perdeu tempo e dinheiro em suas pesquisas. Tivesse consultado o Homem de Orion, teria informações detalhadas sobre a atividade dos extras. Eu, por exemplo, graças a minha convivência com Ducatti, estava muito melhor informado que o SNI.


Um comentário:

  1. Prévidi,
    Lá por meados dos anos 70 do século passado, na saudosa Folha da Manhã, tive o prazer de ter o primeiro contacto com a escrita deste nosso magnífico escritor e grande intelectual polemista. Nas questões das polêmicas, do gênio inquieto, eu me envolvi menos. Mas jamais me olvidarei do prazer que, pouco mais que guri, tive ao ler em capítulos diários em sua coluna da folhinha seu primeiro romance ( não me recordo do título ) e, depois, seus livros e traduções, principalmente do, também genial, Ernesto Sábato.
    O triste é que tenha morrido tão novo; o legal é que tenha tido reconhecimento imenso pela sua obra. Fique com os deuses, cara!

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