Sexta, 3 de outubro de 2024

 


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a censura ter sido feita por outros.



dois minutos
com prévidi


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CANDIDATOS QUE ESTOU NA TORCIDA!





nesta sexta,
a cesta do
j.p. da fontoura


TEXTOS DE
JOÃO PAULO
DA FONTOURA*







REVOLUÇÃO
FARROUPILHA



O (polêmico) morticínio
em Porongos


Neste 20 de setembro recém findo, tão decantado em prosa e verso pelos amantes do tradicionalismo gaúcho, comemoramos exatos 189 anos do início da Revolução Farroupilha; dois meses mais, e teremos 180 anos do polêmico episódio do morticínio dos Lanceiros Negros em Porongos, episódio este, nódoa em nossa história, que nossos tradicionalistas preferem, pela polêmica, ‘deixar de lado’.

A Revolução de 1835 é a mais importante da nossa história, pois foi a que mais próximo chegou a uma secessão no sólido império brasileiro, à que se espraiou até a vizinha Santa Catarina – gerando a efêmera e inditosa República Juliana. Há também a questão da duração, 10 anos de briga intestina, não é fácil! Temos ainda o fato (por muitos do resto do país escamoteado) de que o ditador argentino Rosas estava pronto para liderar, junto com o Uruguai e a nossa República Rio-grandense, a construção de um novo gigante meridional. Portanto, mesmo que no resto do Brasil brinque-se que 'a Revolução Farroupilha foi uma guerra que perdemos, negociamos por empate e festejamos como vitoriosos’, nossos líderes mantiveram-se firmes e acabaram negociando uma paz JUSTA!

Para mim, somos vencedores e carece festejar, muito!

A Corte Imperial tinha medo de que os rio-grandenses se unissem aos platinos e formassem um estado forte e ameaçador ao domínio do império no Sul da América. Portanto, mesmo à véspera de uma muito provável derrota, negociamos e, entre outros benefícios de somenos,  ganhamos:

1)    Anistia a todos os revoltosos;

2)    Integração dos oficiais rebeldes ao Exército Imperial com as suas respectivas patentes;

3)    Liberdade para os escravos que haviam participado da guerra (cabe aqui ressaltar o triste episódio de Porongos – que detalharei abaixo);

4)    Devolução aos seus donos de todas as propriedades ocupadas ou confiscadas durante a guerra;

5)    Pagamento pelo Império das dívidas;

6)    E, por fim, a indicação do presidente da Província pelos Farrapos. Alguém quereria mais?

Mesmo que não tenhamos sidos vencedores na questão das ideias, ou seja, no ideal de um mundo novo por aqui, com a não intervenção do estado na economia; com o controle do poder executivo pelo legislativo para se evitar o estado absoluto; com a federação das províncias; com uma nova e moderna Constituição; pela solução da questão econômica do charque e também do imposto sobre o sal importado, para quem – o Império Brasileiro – tinha como hábito esmigalhar qual vil inseto quaisquer atos revolucionários (forca para os líderes, desterro para os participantes menores), não podemos reclamar, pois foi uma boa negociação, não concordam?


Outra questão

Caros leitores, foi uma revolução democrática, do povo? Obviamente que não. Não havia como. Numa província com uma população de 180 mil rio-grandenses (não gaúchos, gaúcho por essa época era um termo altamente pejorativo que nominava uma massa de analfabetos boçais e selvagens, uma bugrada de bêbedos livres, nunca assalariados, de saqueadores, homicidas e estupradores) com apenas 5% de alfabetizados, uma revolução somente poderia ser feita por uma elite abonada e intelectualizada de estancieiros.

Assim mesmo, os críticos, grande parte, concordam que os “os ideais liberais e republicanos dos farroupilhas eram progressistas em relação à monarquia brasileira”.

Como o Império, que era impermeável a qualquer mudança, mínima que fosse, e além de tudo tinha o fato de estar sendo governado por regentes, não atendia aos apelos dos sulistas, foi declarada a guerra. Da guerra advieram: a gloriosa República de Piratini; as gestas épicas; a prisão e a fuga do general Bento; a dilatação do movimento com a formação da República Juliana na vizinha Santa Catarina; o início – a partir de 1840 – das perdas de territórios conquistados, sendo a batalha de Ponche Verde, em 1843, o último sucesso bélico farrapo; as inevitáveis desinteligências entre os bravos líderes; das desinteligências, os ódios, rancores como, por exemplo, o lamentável episódio do duelo entre o Bento e o Onofre Pires que acaba na morte do Onofre; os anos derradeiros com a busca da paz, via negociação, com os imperiais; e, por fim, dez anos depois, exauridos, em 25 de fevereiro de 1845, nos campos de Ponche Verde, com a leitura dos termos por parte de Fontoura e a necessária anuência da maioria dos oficiais farrapos presentes, a lavratura da Paz!

Em epílogo ao texto (talvez, pela importância do tema, um epílogo por demais longo) o polêmico episódio de Porongos ou – houve ou não traição?

Quantas e quantas vezes nas quentes tardes dos desfiles farroupilha, tenho visto negros e negras, altivos, orgulhosamente trajados à tradição, desfilarem sobre seus belos cavalos pelas enfeitadas ruas da minha querida Taquari! Será, questiono-me vezes e vezes, será que eles sabem do episódio de Porongos?

Li, reli, tresli inúmeros livros, jornais, documentos, teses... Mesmo assim, não tenho opinião formada. Existem argumentos muito bons para ambas as teses. Vou de uma maneira rápida listá-los para o discernimento dos caros leitores. Cada um que faça a sua convicção.

A favor da traição

A questão dos negros que lutaram pelos farroupilhas era um óbice à paz.

Os republicanos exigiam alforria para todos e com isso criavam um brete às negociações com os imperiais.

Para os líderes da corte, mesmo querendo resolver logo a questão sulina, a instituição do escravagismo continuava sendo um forte instrumento de unificação nacional, algo imexível; mesmo injusto, mesmo moralmente errado, era a forma de manter os ‘poderosos donos de terras’ em paz e em sintonia com o Império. É cínico, mas era assim que funcionava. Então, com o intuito de finalizar a guerra, o taquariense David Canabarro, mancomunado com Caxias, teria mandado, na madrugada de 14 de novembro, desarmar todos os escravos. Afirmam alguns a existência de uma carta de Caxias mandando o coronel Francisco Pedro de Abreu, o Pedro Moringue, atacar o acampamento e matar os desarmados lanceiros negros e poupar somente os brancos e índios. E assim foi feito.

O Corpo de Lanceiros Negros, uns 100 valentes guerreiros, desarmados, desprotegidos, foi dizimado!

Convenientemente, Canabarro e alguns altos oficiais tinham se retirado do acampamento para resolver problemas ‘prementes’.


O óbice às negociações não existia mais

Três meses após – a paz foi assinada. Como prova da traição, Canabarro foi processado pelos republicanos. Não deu em nada, até porque o julgamento foi na corte.

Contra, não houve traição, só uma fatalidade de guerra,

Houve, isso sim, um ato isolado do louco Moringue que atacou o acampamento por moto próprio, na tentativa de se promover junto a Caxias.

Jamais Caxias daria tal ordem.

Na condição de governador da Província, era o maior interessado na paz imediata.

Havia um decreto de suspensão das armas, o armistício.

As negociações pela paz estavam muito adiantadas.

O desarmamento dos Lanceiros Negros inseria-se nesse contexto.

Outras duas provas irrefutáveis: uma) o próprio Canabarro foi pego de surpresa e teve de fugir com suas roupas de baixo da tenda da sua amante, a ‘papagaia’ (casada com um boticário/médico taquariense, de nome João Duarte, das tropas farrapas conhecido por ‘papagaio’). Ora, se soubesse do ataque, jamais seria pego com as calças na mão! A outra) o negociante republicano pela paz junto à Corte, o plenipotenciário Antônio Vicente da Fontoura, estava de viagem marcada para o Rio de Janeiro e havia dormido no acampamento, tendo, na fuga, extraviado documentos importantes. Não faz senso! No seu diário, escreve Fontoura: ‘Bagé, 18 de novembro de 1844. Como são falíveis os juízos dos mortais! Minha carta de 13, e esta, bem o provam. Não quero fazer, porém, a descrição do revés que tivemos a 14, porque o Gabriel vai e ele que o conte. Fui feliz e tudo quanto nos pertence. Os meus possuelos foram-se. Ficou a Lindoca sem a sua caixa de tintas e a Bindunga sem o lenço!’


Cada um julgue conforme sua consciência

Como alhures afirmo, ainda não tenho (e talvez nunca o tenha) um juízo formado. Agora eu, se negro fosse, jamais festejaria o 20 de setembro sem que a questão fosse plenamente aclarada.

Julgo fundamental que uma comissão de notáveis historiadores, gente com alto saber, com um mínimo de 50% de negros, estudasse o polêmico episódio e emitisse um parecer final.

A verdade absoluta, até mesmo pela distância temporal do evento, dificilmente será alcançada. Mas, com critério, objetividade e isenção, é sim possível trazê-la a uma distância mais próxima à realidade.

E isso importa muito!  

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que motivou a revolta

Sempre tive dificuldades para aceitar como motivo dessa revolução a questão do aumento do imposto do charque, não que a questão em si não tenha sido importante, pois era o produto de exportação mais expressivo e estava alinhado às estâncias e aos estancieiros criadores de gado bovino. Até mesmo porque as fronteiras eram portões abertos e imperava o descaminho via Uruguai – sempre à mão.

Revolta, sim, revolução, nunca!

É evidente que o centro da questão foi político, briga por poder entre conservadores (caramurus) e liberais.

Os liberais eram a maioria dos gaúchos, pois na eleição para a primeira Câmara Provincial, de 1834, a composição ficou em 16 deputados liberais e 12 conservadores. A maioria exigia a descentralização do poder, a federalização da administração, que as províncias pudessem elas mesmas escolher seus governantes, legislar, etc.

Para os liberais, o Sete de Setembro era algo sacro, simbolizava a regeneração e total independência do Brasil.


* Abaixo vou listar as teses/contrariedades/reclamações constantes do Manifesto de 25 de setembro de 1835, exarado pelo Bento Gonçalves e seus correligionários, as quais retirei do livro A Guerra dos Farrapos, de Fernando Luís Osório, filho do marechal Manoel Luís Osório, este sim, testemunha ocular dos  eventos, pois participou integralmente da grande gesta, iniciando pelo lado dos revoltosos e terminando ao lado do Império:

1)    As arbitrariedades do governo provincial;

2)    A proteção que este (presidente Braga) dera aos atentados de homens perversos, prestando-se ao mesmo tempo a servir de instrumento de seus designos contra os livres;

3)  Os justos ressentimentos contra os retrógrados (caramurus, conservadores) que, apoiados pela autoridade armaram braços mercenários e estrangeiros para ameaçarem a cidadãos pacíficos que festejavam salutares reformas da Constituição;

4)    As promessas falazes do presidente Braga;

5)    As aprovações de todos os atos de seu irmão (do presidente) Pedro Chaves cometidos acintosamente contra os adversários;

6)    As calúnias, as intrigas, as vinganças e as perseguições;

7)    As prodigalidades de empregos pelos homens mais impopulares e apontados pelos seus princípio retrógrados;

8)    As desatenções ao direito de petição garantido na Lei e os maus tratos aos peticionários acusados como sediciosos;

9)    As prisões cheias de patriotas e a província em processos e querelas;

10)  A desmoralização levada à infantaria da Guarda Nacional para dispersá-la, e a suspensão arbitrária de seu comandante cujo crime era o seu inabalável patriotismo;

11)  A criação de uma guarda pretoriana debaixo do nome de Guarda Nacional de cavalaria para custodiar Porto Alegre;

12)  Os desperdícios de dinheiro público com as remoções desnecessárias de tropas militares;

13)  As nomeações contra expressas instruções da Regência e as preterições de antigos servidores da pátria para proveito dos seus inimigos;

14)  As deportações;

15)  O Templo de Têmis convertido em forja das mais injustas perseguições;

16)  As violações da sagrada garantia do habeas corpus;

17)  As escandalosas e impunes introdução de africanos e da moeda de cobre que afligiam a Província;

18)  As acusações caluniosas de quererem desmembrar a Província do Império feitas àqueles que em todos os tempos expuseram suas vidas e verteram seus sangues em defesa da sua integridade;

19)  A entrega dos empregos mais importantes a membros da facção retrógrada, com esquecimento dos influentes do partido liberal;

20)  As ameaças do Comandante das Armas de ir buscar força armada num estado vizinho para sufocar qualquer tentativa dos homens livres;

21)  O uso feito pela autoridade da liberdade de imprensa para espalhar suas doutrinas retrógradas e impopulares, e atacar com o fel da calúnia reputações adquiridas por uma larga série de serviços feitos à Pátria, e semear a discórdia e dividir para reinar;

22)  Os esbanjamentos do Tesouro para comprar prosélitos e suprir os gastos da administração pródiga e desatinada;

23)  A corrupção da magistratura, prevaricando, legalizando injustas perseguições e os atos mais arbitrários;

24)  O menosprezo com que os periódicos do governo tratavam o povo, considerando os honrados e industriosos camponeses como sepultados nas trevas das mais crassa ignorância, como ineptos para defenderem seus interesses políticos, apelidando-os de bárbaros, pobretões e proletários;

25)  A decretação do oneroso, injusto e cruel imposto de dez mil réis anual sobre cada légua quadrada de campo, que recaía sobre o capital e não sobre o produto, que pesava, desigualmente, em razão da maior ou menor fertilidade dos campos;

26)  A decretação de um corpo de polícia de 700 praças para com a ponta de suas espadas fazer exequíveis as medidas mais impopulares e opressivas;

27)  O contrasenso de achar-se o partido liberal perseguido e fora do poder sendo no entanto maioria na Província.

Não são as 95 teses de Martinho Lutero afixadas às portas da Igreja de Wittenberg em 1517. São menos, bem menos, mas somente uma das 27 diz respeito a impostos!


*joão paulo da fontoura é escritor e historiador diletante, membro da ALIVAT – Academia Literária do Vale do Taquari, titular da cadeira nº 26.

2 comentários:

  1. Na verdade a "Revolução" Farroupilha não passa de um emaranhado de coisas e fatos até hoje, mal ou pouco explicados. Duvido que algum desses gauchinhos fantasiados, que abundam em CTGs, tenha conhecimento de 1% do que foi a tal ""Revolução"". Ela é usada de pano de fundo para se desfilar um certo orgulho canhestro de algo que não seria motivo de orgulho em lugar algum. Enfim, o gaúcho é isso mesmo, um saudosista de algo que, em verdade, nunca foi.

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  2. Uchoa, acho que temos que festejar sim, pois uma Nação, um Povo é feito de mitos. O mito é necessário, é marca uma identidade.
    Vamos lá, se Cristo existiu ou não, não importa, pois o que importa é que "não podemos prescindir do mito 'Cristo'", ou seja, 'Cristo' tem que ter existido.
    Os nossos Bento Gonçalves, Bento Manuel Ribeiro, David Canabarro, o Netto, eram homens da sua época com as virtudes e o defeitos de qualquer ser humano.
    A minha bronca é com o episódio de Porongos, que TEM QUE SER ESCLARECIDO!!!
    Abração.

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