Bom Dia!! Sexta, 12 de abril de 2013

ESCREVER BEM NÃO É FÁCIL.
ESCREVER SIMPLES, ENTÃO...

Tenho muito orgulho da minha família.
Assim como tenho muito orgulho das pessoas que convivo e, claro, os que admiro.
Também tenho uma grande admiração por aqueles que são meus amigos e, mais, dominam o ofício em que nos dedicamos há décadas. Para ser mais claro, amigos jornalistas que escrevem de uma maneira simples, que todos entendem. Parece "simples", mas não é.
Escrever é um negócio muito complicado. Ainda mais quando o autor quer ser compreendido por todos.
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Na década de 70 tomei conhecimento de pessoas que escreviam assim. O maior de todos foi Erico Verissimo. Posso dizer que li todos os seus livros (e um gaiato pode dizer que não aprendi nada!!).
No jornalista foi em O Pasquim. Dois dos meus ídolos escreviam desta forma: Jaguar e Ivan Lessa. Lia e relia os textos que assinavam (...e não aprendi nada!!)
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Hoje, de manhã, me deliciei com dois textos de queridos amigos. Jornalistas que não são mestres nem doutores mas poderiam ensinar muito a inúmeros mestres e doutores em Jornalismo.
Fernando Albrecht e Eliziário Goulart Rocha são exemplos de jornalistas que dominam o ofício.
Chega de papo!!
Leiam.
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EM BUSCA DO TEMPO GANHO

Fernando Albrecht

No preciso momento que escrevia estas linhas completei 25.550 dias de vida na terra, ou 613.200 horas, ou 36,792 milhões de minutos, ou 2 bilhões 207 mil e 520 segundos, e contando. Fazendo um balancete da minha vida devo ter trabalhado em 300 mil horas e pelo menos em 30% não me diverti com o que fazia; dormi cerca de 150 mil, acho que também perdi 50 mil horas no trânsito.
Não saberia calcular quanto tempo de todo esse tempo perdi em chatices diversas, mas arrolei algumas delas. Por exemplo, gastei vida em filas diversas, chás de banco em repartições públicas, também foram pro saco horas e horas de mijadas de patrão, mais um bocado delas em que estive gripado, ouvindo chato de churrascaria, reunião de condomínio e formatura, cortando unhas e cabelos, ouvindo sermão de pais e mestres, lendo e respondendo releases cretinos e conversa de jacu. Velório não, porque aprendi muita piada nova em velório.
No vaso, você tem ideia de quanta vida perdeu sentado no vaso?
Antes que algum cabo corneteiro pense quanto tempo gastei nos combates de Eros, tenho a dizer que foi menos do que eu queria e mais do que eu merecia, e isso não pode ser contabilizado como tempo perdido. Nessas coisas você tem que levar em conta mais a qualidade do que a quantidade. Nada de serviço rápido e mal feito, como se fala da cavalaria. Ser ninja dos lençóis, vocês sabem, exige perícia e horas de voo. Enfim, consegui um bom superávit primário. E mais não digo, ainda não me autorizei a fazer minha autobiografia.
Espero que esses dados e números sejam levados em conta pela CVTC – Comissão de Valores Teoricamente Celestiais. Como não cheguei ainda ao dia fatal do balanço, que espero estar muito além do horizonte visível e, se o Grande Contador não me aprontar uma, tenho que confessar que, até agora, tive mais lucros do que perdas, desde que no lucro depois dos impostos não seja computado o dinheiro que não ganhei.
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OS SUSPEITOS DE SEMPRE

Eliziário Goulart Rocha

Em 1994 eu era editor executivo do jornal Zero Hora e tinha, entre minhas tarefas, editar a capa do jornal e coordenar a reunião de capa, da qual nem sempre participavam o diretor de redação e o editor-chefe. Nesta reunião os editores de cada área apresentavam os assuntos que teriam destaque na edição. Logo depois da implantação do Real, ao final de uma reunião na qual todos disseram não ter nada interessante naquele dia – cheguei a brincar: “Ok, a gente cancela a capa” –, solicitei à Rosane de Oliveira, editora de política, e ao Moisés Mendes, da economia, que permanecessem mais um pouco comigo e com o Ricardo Chaves, editor de fotografia, pois não poderíamos sair dali sem ao menos uma sugestão de manchete.
Uma nova rodada com a Rosane não ajudou, ela tinha razão, o dia estava mesmo muito morno na política. Pedi então ao Moisés que repassasse todos os assuntos para uma nova avaliação. A abertura da economia seria um “pequeno aumento nos hortigranjeiros, coisa pequena, não dá manchete”. Perguntei então a ele se aquele não era o primeiro aumento de preços de qualquer produto depois do Real. Ele confirmou. Questionei então se os hortigranjeiros não eram costumeiros puxadores de altas de preços. Ele disse que sim. “Mas manchete não segura”, reforçou Moisés.
Quando não se tem uma grande manchete, a solução é ousar um pouco. Expliquei minha ideia ao Kadão e ele foi atrás da melhor imagem (sempre lembrando que não havia internet, não se achava qualquer foto no Google em segundos).
A manchete formal eu nem lembro qual acabou sendo, mas o assunto dominante, ocupando uma grande área da capa, foi esse: uma foto bem grande de tomates, um superclose, com o título “Os Suspeitos de Sempre” e um pequeno texto. Trata-se de uma fala clássica do filme Casablanca: o chefe de polícia local manda prender “os suspeitos de sempre” como forma de agradar aos ocupantes nazistas da cidade e, ao mesmo tempo, nada fazer a respeito. O diretor de redação, Augusto Nunes, bancou a aposta e ZH foi às bancas com uma capa diferente, chamativa e, ao mesmo tempo, respaldada jornalisticamente pela boa cobertura da economia.
Quase 20 anos depois, com os tomates na ordem do dia, resolvi contar esta pequena história.


Um comentário:

  1. Obrigado, amigo, pela publicação e pelas palavras elogiosas. Grande abraço.

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