DOMINGO É DIA
DE JORNAL IRRELEVANTE
Abro a porta do apartamento, apanho O Globo que está no
chão, sobre o tapete de boas vindas, leio rapidamente os títulos, e sou
assaltado pela primeira dúvida de um domingo que eu preferia que fosse dedicado
apenas à preguiça: existe algum motivo para um carioca comprar este jornal nas
bancas? Como assinante, já paguei por ele e talvez mantenha a assinatura – por hábito
pessoal e razões profissionais. Mas se fosse leitor avulso, sem costumes
arraigados em relação aos jornais, é provável que escolhesse outra publicação
quando fosse à banca da esquina.
O Globo de domingo já teve tiragens de mais de 1 milhão de
exemplares, entre assinantes e venda avulsa, na primeira parte dos anos 1990. É
verdade que havia o estímulo da distribuição de fascículos de um dicionário,
mas é razoável calcular que mais da metade desta venda se referia
exclusivamente ao interesse do leitor pelo seu conteúdo – a partir da atração
exercida pela capa exposta nas bancas. Hoje, duvido que a tiragem de domingo
ultrapasse 400 mil exemplares, no máximo algo em torno disso. Muito menos que a
metade, mais de 15 anos depois.
Uma rápida análise da primeira página do Globo pode explicar
em parte o desinteresse, embora se deva levar em consideração, claro, razões
menos específicas, como mudanças de hábitos das famílias, a força da internet e
sei-lá-o-que-mais. Mas a leitura da primeira página diz muito sobre
irrelevância, falta de novidade, incapacidade de surpreender, agenda superada e
outros bons motivos para a condenação de qualquer jornal à irrelevância.
Vejamos, a partir do alto, o que a capa do Globo nos oferece
como convite à leitura.
Uma entrevista com
Lázaro Ramos.
O que pode haver de novo numa entrevista com Lázaro Ramos?
A legalização da
maconha no Uruguai.
Este assunto tem pelo menos três meses de idade.
A manchete, segundo a
qual as Câmaras municipais são caras e pouco transparentes.
Além do defeito, recorrente, de considerar a vida
institucional do país onerosa, como se fosse melhor viver sem instituições e
sem democracia, trata-se de assunto velho e adverte o leitor, desde logo, que ele
será submetido a uma ciranda de números e exemplos manjados.
A notícia de que
Delúbio Soares é réu em outra ação além do mensalão
O que ainda poderia surpreender em Delúbio, além da revelação de que ele é inocente de alguma coisa?
A enésima matéria
contra Hugo Chávez.
Aqui, temos uma fixação do Globo e da imprensa brasileira.
A fantástica notícia
segundo a qual “filhos valorizam laços afetivos”.
Eureka!
E mais:
“Fla perde; líder Flu
joga no Sul”.
Como se o Rio não soubesse disso desde ontem.
“A trilionária perda das bolsas na crise”.
E daí? - perguntará o leitor “normal”, desde que não tenha
investimentos diretos ou indiretos em bolsa.
Uma discussão sobre o
novo perfil da CNBB.
Notícia ainda mais velha que a maconha no Uruguai.
Há, é justo que se diga, uma boa foto mostrando o estado da
reconstrução do Maracanã. Mas está abaixo da dobra e, na maioria das bancas,
não será vista.
Vou fazer justiça com O Globo: li logo depois as capas da
Folha e do Estadão e não pude perceber, também neles, muito esforço para
surpreender o leitor de domingo. Se minha crítica tem algum sentido, certamente
pode ser dirigida à maioria dos jornais brasileiros.
-----
OLHA A CAPA DA ZH DE DOMINGO
As chamadas de capa de domingo, 9 de setembro de 2012:
-
Pense Empregos
Vagas e bons salários em profissões técnicas
-
Semana Farroupilha
Dez palcos da Guerra do Farrapos
-
Compra online
Benefícios e armadilhas da importação
-
Bons exemplos
Receitas de coreanos e finlandeses para educar
-
O alvo de sempre
Interior tem 17º ataque a banco com explosivos
-
Donna
A reinvenção dos motéis
A contracapa:
-
Dinheiro
Voo esquecido
-
TVShow
Moça sonhadora num Brasil em transformação
-
Esportes
Jardel, o treinador
-
Gabiru, o rei de Bagé
O amigo compraria a Zero Hora de domingo se lesse estas chamadas?
Prévidi
ResponderExcluirMuito bom esse post.
VOu dar meu pitaco.
Acredito que a mídia impressa está passando pela mesma involução da TV aberta.
Basicamente a imbecilização.
Essas midias resolveram atender à grande massa brasileira, a dos iletrados, ou analfabetos funcionais.
Então resolveram seguir o caminho da maioria e se voltar para bobagens e porcarias.
As pessoas com maior capacidade analítica se voltaram para a Internet, aquela onde há ainda vida inteligente, pois inegável que existe na internet muita bobagem também.
Na minha modesta opinião acho um erro esse caminho seguido, que se utilizem de Diario Gaucho e outros para isso, não precisavam fazer isso com toda a mídia. Mas como quem manda é a audiênica ou a "maioria", acabamos sofrendo com isso.
Abcs