Bom Dia!! Terça, 17 de julho de 2012

EXISTE ALGO MAIS RIDÍCULO??!!



Imagina!!
A raiva dos doutorzinhos e doutorazinhas ao verem esta campanha publicitária!!
Recebi ontem um e-mail com esta peça.
E, mais uma vez, cheguei a uma conclusão: muitos guris e gurias fazem Medicina para vistir um jaleco branquinho e usar um estetoscópio enrolado no pescoço.
Numa época trabalhei nas cercanias de um hospital. Tinha um bar/restaurante que almoçava e fazia lanche. Pois bem, todos os dias o lugar era invadido por hordas de doutorzinhos e doutorazinhas de jaleco branquinho e estetoscópio pendurado no pescoço.Riam, se mostravam, orgulhosos!!
Aí comecei a notar no hospital onde ia visitar um familiar. A grande maioria deles usava estetoscópio, bem a vista. Até proctologista se exibe!!
Na TV já vi uma nutricionista dando entrevista enrolada num estetoscópio!!
Por que, meu Deus do Céu, um médico experiente tem que conceder uma entrevista com o estetoscópio brilhando no pescoço??
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Há uns anos lancei o meu egundo livro: 15 Maneiras de Ser Ainda Mais Feliz - aliás, ainda está a venda.
Lá tem a historinha abaixo. Vale a pena.


O estetoscópio no pescoço

Fui criado para ser médico.
Minhas primeiras lembranças de vida seguem um roteiro escrito por meus pais. Eu não brincava como meus irmãos. Nada de bola, nada de polícia/ladrão. Lembro bem de um presente de aniversário, lá pelos 5 anos. Era uma caixa que trazia instrumentos médicos de plástico. Até um estetoscópio. E dois aparelhos de injeção. No Natal ganhei uma outra caixa, com um laboratório de química.
A injeção tinha utilidade. Levava para a escola. Tinha uma colega na escolinha que sentava ao meu lado e adorava que aplicasse injeção em seu bumbum. Gostávamos muito.
Era muito pequeno, mas vi sem entender o seriado Doutor Kildare. Depois acompanhei, ao lado de meus pais, a série Plantão Médico e ainda uma chatíssima produção nacional chamada Mulher, sobre médicas boazinhas. Tudo que dizia respeito a medicina me jogavam no colo. Lá pelos 15 anos já estava acostumado e até gostava daquelas histórias de salvadores da vida.
Fui criado para ser médico.
Minha mãe me inscreveu para o vestibular numa universidade pública. Nem me perguntou. Me mostrou o papelzinho que dizia “Medicina – manhã”. E guardou, como fina jóia. Fui mal nas provas, o que não impediu que ela ficasse quase duas horas grudada num rádio de pilha para ver o milagre se consumar.
Um ano depois fracassei de novo, mesmo que passasse os dias e noites tentando decorar fórmulas e regras. Não trabalhava e meu avô pagava um curso pré-vestibular. Nesse ano vi um filme com um primo. Era sobre um maluco chamado Patch Adams. Nada a ver comigo e com tudo o que sabia sobre ser médico.
Consegui na terceira tentativa. Não imaginam a festa que fizeram lá em casa. Meus pais chegaram a comprar um espaço no jornal de domingo para anunciar ao mundo que eu seria um médico.
Um dia antes do primeiro dia de aula, minha mãe foi ao meu quarto. Estava com um bonito pacote nas mãos. Meu pai vinha logo atrás com um pacote menor, mas também bonito. Nem era meu aniversário.
Espantei-me quando abri o pacote que minha mãe me deu. Segurei as lágrimas. Era um jaleco branco, de linho, com meu nome bordado no bolso de cima, do lado esquerdo. E ela não tinha nem esquecido um Dr.
Meu pai também me emocionou muito. Era um estetoscópio, um legítimo Littmann, o melhor do mundo.
As surpresas não pararam. Meus dois irmãos entraram no quarto e seguravam, cada um com uma mão, uma pequena caixinha. Pensei que fosse alguma presepada. Abri a caixa com todo cuidado e não entendi. Era um chaveiro com três chaves. Fiquei olhando com cara de bobo e mostrei para o papai. Ele me disse para ir na rua, experimentar a chave no carro que estava parado em frente de casa. Era demais.
Fui criado para ser médico.
No primeiro dia de aula fui de carro. Em uma pasta, que meu pai usava nas suas viagens, levei o jaleco e um caderno. O estetoscópio estava numa bolsinha do lado de fora da pasta. Era o dia mais feliz da minha vida. Mais feliz até que os dias em que minha coleguinha pedia para que eu aplicasse uma injeção em seu bumbum.
Foram anos e anos de muito estudo. Muitos jalecos de linho mamãe teve que lavar e engomar. Sempre andei impecável e era elogiado pelos professores. Aprendi a usar o meu Littmann, que me acompanhou durante todo o curso, em volta do pescoço. Sem cair. Já saía de casa com ele e só o tirava quando chegava em casa, extenuado, no início da noite.
Depois do período de residência cheguei a ter cinco locais de trabalho, contando com o atendimento no consultório, anexo a nossa casa, que meu pai mandou construir. Comprei vários estetoscópios. Tinha uns modelos para passeio, mais casuais. Chegava à sofisticação de à tarde usar um outro Littmann. Tinha uma pasta no carro com todos os estetoscópios que usava no dia-a-dia. Sempre combinava o aparelho com a gravata que estava.
Fui criado para ser médico.
A cada novo cliente que recebia me lembrava da minha coleguinha de jardim de infância. Aquela que gostava de tomar injeção no bumbum. E enquanto o infeliz despejava seus infortúnios, eu pensava nas minhas infelicidades.
Numa noite, quando minha mãe me trouxe um copo de leite quente, tentei conversar sobre minhas tristezas. Ela mudou de assunto. Relevei, porque mamãe estava com idade avançada e, afinal, tinha lutado toda sua vida para tornar-me um médico.
Os meses foram passando e as minhas angústias aumentavam, tanto quanto as minhas poupanças. Estava rico.
Não me lembrava quando tinha sido o último domingo que não trabalhara. O dia estava bonito e fui passear em um parque. Muita gente caminhando, correndo, brincando. Deveria ser muito bom agir como eles. Só consegui me lembrar da minha coleguinha que gostava de tomar injeção no bumbum, no jardim de infância. O que mais de interessante na minha vida?
As pessoas passavam por mim e me olhavam, curiosas. Resolvi me olhar. Estava com um dos meus inúmeros jalecos de linho, engomados pela minha mãe, e com o estetoscópio no pescoço. Um daqueles, para passeio. Tinham que me olhar, mesmo.
Fui criado para ser médico.
Sem que o pessoal de casa imaginasse, pedi demissão de todos os hospitais e clínicas em que trabalhava. Fiquei só com o consultório anexo a minha casa. Quando não atendia meus clientes, dirigia pela cidade, sem saber o que fazer, mas procurava alguma coisa. Até que num subúrbio passei por uma farmácia, em uma esquina, que tinha uma placa de “Vende-se”. Chamei pelo dono e sem muita conversa disse que voltaria no dia seguinte com meu advogado para fechar negócio.
Contratei uma decoradora para torná-la a mais bonita farmácia da cidade, mesmo sendo em um bairro distante da área central. Encerrado o trabalho de embelezamento, mandei fazer uma grande placa, com néon, e escrita em letras garrafais a minha realização: “Farmácia do Doutor”. Contratei duas balconistas e dei um treinamento intensivo para que soubessem tudo do negócio.
Continuava atendendo na minha clínica, mas cada vez em menos horários. A minha coleguinha do jardim de infância que gostava de tomar injeção  não me saía da cabeça.
Num dia, cheguei no horário de sempre e abri o negócio. Com as duas funcionárias prontas para o trabalho, voltei ao profissional que tinha feito a belíssima placa anunciando a “Farmácia do Doutor”. Pedi uma menor, do mesmo estilo, com néon da mesma cor: “Aplica-se injeção”.
Fui criado para ser médico.
Mas, apesar disso, hoje, sou feliz.

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