Sexta, 18 de outubro de 2013 - parte 3

CRONISTAS

Rogério Mendelski

Sabes qual o principal problema de alguns cronistas?  Respondo: a soberba. Eles têm a pretensão de ser os detentores do monopólio da opinião. Algo assim como "daqui da minha coluna eu digo como deve ser o comportamento dos 'meus' leitores" e a pretensão começa com o pronome possessivo. Essa gente não aprende que quem trabalha de empregado num veículo de comunicação tem sua liberdade balizada até o gabinete do patrão. Isso vale para o jornalzinho do bairro, mas vale também para o colunista do New York Times. A única variação está na dimensão dos interesses, mas a essência é a mesma, ou seja, quem tem liberdade mesmo é o dono do veículo. Ele a concede de acordo com o andar da carreta.
 Quando foi editado no AI-5, o Jornal do Brasil fez uma de suas melhores edições criticando o arbítrio do governo. Mensagens da redação do JB foram incluídas na previsão do tempo e nos classificados, sem o consentimento da dona do jornal, a Condessa Pereira Carneiro. No outro dia, ela foi visitada pelos milicos que mostraram as "notas subversivas" de seus jornalistas e ameaçaram fechar o jornal. O JB tinha seus interesses econômicos e comercias que poderiam ser inviabilizados com qualquer possibilidade de uma pressão do governo. O que fez a Condessa? Foi na redação,  contou que fora traída pelos redatores, pois não ficara sabendo das notas contrabandeadas. E lascou uma frase definitiva: "Quem quiser ter opinião que compre um jornal".
Não mudou nada, só o jornalismo escrito que está perdendo seu talento com gente despreparada que não sabe diferenciar milhão de bilhão, metro quadrado de hectare, invasão de ocupação e risco de morte do risco de vida. Vem daí a proliferação de cronistas e articulistas. Quem tem mestrado acha que sabe escrever em jornal, por exemplo, mesmo que sua tese seja uma compilação do google.
Em São Paulo tem escritórios que te vendem um trabalho de conclusão de curso sobre qualquer assunto - dos sambaquis de uma tribo desaparecida à formiga da lenha.
Assim é que cronistas que se dizem da classe média alta acham que podem dar lições de comportamento como se passar com o sinal fechado fosse apenas um desvio de conduta de quem tem um Gol 1.0. É no supermercado que eu vejo madames e cavalheiros - todos de classe média alta - estacionarem seus SUVs importados ocupando duas vagas.
 Por 30 anos passei meus verões em Jurerê e quem me fez abandonar essa praia não foram os farofeiros, mas a chinelagem fashion, o novo rico que se veste como manda a novela da Globo e que vai a Miami comprar o enxoval do filho que vai nascer, só para mostrar para o seu grupo as roupinhas made in China ou made in Bangladesh.
Certa vez fui com uma missão empresarial à Europa. Seus integrantes, todos empresários do comércio, odiavam a concorrência do camelódromo de Porto Alegre. Estávamos em Milão. Ao iniciar a noite, bem defronte de nosso hotel, o comércio tradicional fechou e em alguns minutos estava montada uma feira de camelôs. Como sou um consumidor de feiras populares lá estava eu comprando algum bagulho. Eu e meus amigos comerciantes da comitiva. "Rogério, não vais noticiar isso, não é?"  "Claro que não. Não quero perder o meu emprego!"
Já vi gente fina comprando bolsas falsificadas Louis Vitton na Canal Street, em Nova York. "É, Rogério, mas é uma falsificação perfeita..."  Estamos de tal maneira engajados na safadeza, na esperteza, na cultura brasileira do jeitinho, que quem se pretende dar conselhos precisa dizer que é "classe média alta", como se isso lhe desse imunidade e cadeira cativa no Olimpo, onde só os deuses sabem pegar o talher certo e beber champâ "when the sun goes down" - é assim que essa gente fala. Eike Batista tinha (não sei se ainda tem) uma Mercedes Benz SLR McLaren no seu gabinete. Sinceramente, sou mais um pinguim sobre a geladeira. Pelo menos é mais honesto e menos demonstração de chinelagem.
É que ser chinelão não é uma questão de conta bancária, mas de comportamento, de educação. Na semana passada, um auxiliar de pedreiro, cujo filho, viciado em drogas assaltou um posto de gasolina e uma farmácia, chorou de vergonha na televisão. E o que ele fez? Foi nos dois estabelecimentos, desculpou-se com seus proprietários e pediu para pagar a dívida dos objetos roubados em dez vezes. Isso é gente finissíma. E provavelmente, esse respeitável senhor nunca tenha bebido champã. Na melhor das hipóteses, uma cidra bem doce, mas sua dignidade paira bem acima das superficialidades dos conselhos dos cronistas.


7 comentários:

  1. Quer conhecer o comportamento classe média alta? Fique meia hora observando um estacionamento de um shopping. José Luiz Soares - Santa Rosa

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  2. O Rogério é tão bom escrevendo quanto falando. Parabéns pela manifestação. Suas palavras são sábias e faço-as minhas. Abraço do ouvinte.

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  3. Dá gosto de ler...jurei que ficaria longe desta "pseudo-polêmica" das cronicas "jecas"...mas o texto do Mendeslki tá ótimo.
    Como já disse antes: e tem coisa mais "jeca" que burguês criticar burguês?
    Diz bem o Luiz Felipe Pondé: essa gente me dá sono.

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  4. O Prévidi
    Convida o Rogério para ser um cronista aqui do Blog
    Parabéns Rogério pelo texto!
    Isso sim dá gosto de ler!
    Não aqueles textinhos que só servem de papel higiênico da ZH

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  5. Isso sim, é uma crônica.

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  6. É burguês criticando burguês. Nada além disso. kkkkkkkkkkk

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  7. exatamente.. um burguês falando dos outros burgueses.. fim

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