Sexta, 27 de agosto de 2021

 

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especial

Nesta sexta, uma cesta 
de 
Guilhermino César!


Um mineiro muito gaúcho




O conto é o signo do homem moderno.








Guilhermino Cesar (da Silva) nasceu em Eugenópolis, 15 de maio de 1908. Escritor, crítico literário, jornalista, professor e historiador. Fez parte da geração modernista de Minas Gerais, divulgando seus princípios em artigos, poemas e ensaios publicados em jornais e revistas, e ao mesmo tempo ocupou várias funções públicas como administrador e professor. Na década de 1940 transferiu-se para Porto Alegre, onde continuaria a desenvolver ativa carreira no magistério, na política e na cultura. Deixou obra referencial na literatura, na crítica literária, na crônica jornalística e na historiografia.

Guilhermino era filho de José Cesar da Silva, farmacêutico prático e escrivão do Registro Civil que se interessava pela poesia e publicava um jornal, e Isaura da Fonseca, filha de fazendeiros. Ainda pequeno sua família mudou-se para Tebas, Minas Gerais, onde aprendeu a ler e escrever com uma professora particular, Zizinha Negreiros. Com 8 anos escreveu seus primeiros versos. Em 1920 foi matriculado no Grupo Escolar Astolfo Dutra, em Cataguases, onde permaneceu pouco tempo, transferindo-se para o Ginásio Municipal e participando também do Grêmio Literário Machado de Assis, do qual foi diretor.

Com Ascanio Lopes e Francisco Ignácio Peixoto

Em 1926 já estava em Belo Horizonte estudando Medicina, e ao mesmo tempo fazendo curso de música no Conservatório Mineiro. No ano seguinte, aos 19 anos, foi um dos fundadores da Revista Verde, de caráter modernista, juntamente com Rosário Fusco, Ascânio Lopes, Francisco Inácio Peixoto e outros, já publicando contos, crônicas, poesias e crítica literária. A revista lançou apenas seis números e dissolveu-se com a morte de Ascânio Lopes, mas teve colaboradores do quilate de Mário de Andrade, Carlos Drummond de Andrade, Sérgio Milliet e Marques Rebelo.

Em 1928 trocaria o curso de Medicina pelo de Direito. Enquanto isso empregou-se em folhetins e em 1929 foi admitido no jornal Estado de Minas, que acabaria encampando o tabloide Leite Criôlo que Guilhermino fundara com Achilles Vivacqua e João Dornas Filho para divulgar os princípios modernistas. Formou-se em Direito em 1932, e como orador da turma fez um discurso criticando o ensino universitário.

Com a esposa e filho, em 1965

No ano seguinte casou-se com Wanda Belli de Sardes, com quem teria os filhos Guilhermino Augusto e João José. Em 1935 passou a trabalhar como oficial de Gabinete da Secretaria do Interior de Minas Gerais, foi também chefe de Gabinete da Chefatura da Polícia de Belo Horizonte, mantendo paralelamente ativa participação na vida jornalística, literária e universitária, publicando no Estado de Minas, em A Tribuna, na Folha de Minas e no Diário de Minas Gerais, e dando aulas de Filosofia na Universidade de Minas Gerais e dirigindo a Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras entre 1941 e 1943.

Mudou-se em seguida para o Rio Grande do Sul, chamado para assumir a chefia do Gabinete do interventor federal no Estado, o general Ernesto Dornelles. Sucessivamente ocupou as funções de ministro do Tribunal de Contas (1945), presidente do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Sul (IHGRGS, 1950-1958), secretário de Estado da Fazenda (1953-1956), e professor de Literatura Brasileira, História do Brasil e Estética da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), lecionando nos cursos de Economia, Letras e Arte Dramática. Entre 1962 e 1965 viveu em Portugal, lecionando Literatura Brasileira na Universidade de Coimbra, que lhe outorgou o título de doutor honoris causa.



Voltando a Porto Alegre, reassumiu sua cátedra de Literatura Brasileira na UFRGS, aposentando-se em 1978, mas continuou a escrever ensaios e poesia e publicar crônicas no Correio do Povo. Em 1977 havia sido empossado como vice-presidente do IHGRGS, posição que ocuparia até 1986, fazendo parte também do Conselho Fiscal e da Comissão Editorial da Revista do IHGRGS por diversos anos. Em 1989 foi nomeado sócio-benemérito do IHGRGS e em 1990, patrono da Feira do Livro de Porto Alegre. Também foi membro correspondente do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro e do Instituto Histórico do Uruguai e membro da Academia Mineira de Letras. 

Recebeu muitas homenagens em vida e postumamente, destacando-se os títulos de Professor Emérito da UFRGS e Cidadão Honorário de Porto Alegre, a Palma Acadêmica da Academia Francesa, a Legião de Honra no grau de oficial, a Medalha do Pacificador, a Medalha da Inconfidência e a Medalha Simões Lopes Neto.

Em 1995 uma praça de Porto Alegre foi batizada com seu nome, em 1999 a UFRGS criou no Instituto de Letras o Núcleo de Literatura Brasileira Guilhermino César, e a Secretaria Municipal da Cultura de Porto Alegre instituiu o Prêmio Guilhermino César para homenagear personalidades nascidas fora do Rio Grande do Sul que deram destacada contribuição para a cultura da cidade. Sua intensa atividade em várias esferas públicas e sua qualificada produção intelectual e artística o colocam em um lugar de destaque na cultura brasileira, sendo muito respeitado também em Portugal.

Além da poesia, Guilhermino deixou grande número de artigos publicadas desde sua juventude em vários jornais, mas avulta sua regular contribuição ao "Caderno de Sábado" do Correio do Povo, que por muitos anos foi um suplemento cultural de alto nível, contando com afamados colaboradores. A produção de Guilhermino foi vasta e multifacetada, transitando pela crítica literária, o ensaio histórico, a crônica de costumes e o comentário dos fatos do dia, demonstrando sua vasta cultura de maneira informal, sem se tornar pedante, e sem excluir o humor e uma fina ironia.

Mesmo seus textos mais despretensiosos são ricos em informação e agradáveis à leitura, não perdendo a oportunidade de mesmo a partir de eventos banais extrair um sentido histórico, humano ou social. Sua escrita desperta a curiosidade e o fascínio, instigando e provocando a reflexão, procurando, mais do que informar, educar seu público, sempre preocupado com os destinos da humanidade e os movimento sociais.

Como historiador do RS se insere em um momento em que os estudiosos locais, muito pela influência de Moysés Vellinho, ainda tendiam a priorizar a contribuição lusa à formação do estado, descartando a contribuição jesuítico-espanhola presente na Região das Missões, que só tardiamente foi incorporada ao domínio português.

Contudo, ele acompanhava o constante surgimento de novas fontes históricas, que começavam a mudar o panorama consolidado anteriormente. Destacam-se nesta área os livros História do Rio Grande do Sul no Período Colonial (1970), O Contrabando no Sul do Brasil (1978) e Origens da Economia Gaúcha (o boi e o poder), publicado postumamente em 2005.

Também valorizou a emergência do tradicionalismo gauchesco, dizendo que era um movimento representativo de importante setor da cultura local. Para Maria do Carmo Campos, "Guilhermino deixou à posteridade um importante legado sobre especificidades histórico-culturais da formação do estado, que examinou à luz de sua experiência europeia".

Seu foco como historiador, no entanto, foi a história da própria literatura e da crítica literária, produzindo obras como O Criador do Romance no Rio Grande do Sul (estudo sobre Caldre e Fião), A Primeira Geração Romântica na Literatura Rio-Grandense — Araújo Porto Alegre, O Barroco e a Crítica Literária no Brasil, O Brasileiro na Ficção Portuguesa (com Pereira Filho), Primeiros Cronistas do Rio Grande do Sul e A Visão Prospectiva de Euclides da Cunha, mas seu texto mais importante provavelmente é História da Literatura do Rio Grande do Sul (1737 - 1902) (1956). Nele o autor procura estabelecer as origens da tradição literária local a partir do surgimento da sociedade Partenon Literário em 1869, que para ele constitui um divisor de águas e o momento do primeiro amadurecimento dos autores gaúchos. Porém ele não restringe sua análise histórica ao campo especificamente literário, mas esclarece como a literatura e seus agentes interagiram com a sociedade e influíram sobre ela e foram por ela influenciados, e ao mesmo tempo traça as relações da produção local com a brasileira, enfatizando os regionalismos como características distintivas que contribuíam para a riqueza do panorama nacional e identificando pontos em comum com a produção de outras regiões, rejeitando o separatismo encontrado em certas correntes da crítica de seu tempo. Também ressaltou o papel fundamental exercido pelos estrangeiros e pela imprensa na renovação estética e difusão da literatura. 

Guilhermino César faleceu em Porto Alegre em 7 de dezembro de 1993.



Campeiro de Minas Gerais

Campeiro mulato de sol

Você que dormiu

sem medo de bruxos, sacís-pererês

botando a cabeça fervendo de amores

no couro estendido...

Você não ouve ali perto

de dia de noite

a barulheira da boca da mina?


São filhos da nossa terra também.

Largaram a boiada no morro

serenatas nas ruas familiares

e foram pra noite de ferros tinindo

procurar a lua de metal

escondida nas montanhas duras

saltando depois nos cadinhos...


Você não está ouvindo o ruído dos pilões na baixada

triturando a pedra que vem do fundo

nos vagonetes ligeiros ?


E aquele suor que os companheiros estão suando...

A gente pensa que é sangue

mineiro campeiro!

Eles deixaram a casa sonhando riqueza

e agora estão magros e feios.


Como você dorme bem

cansado das lidas campeiras.

Eles nem podem dormir sossegados:

a mina não fica sozinha um momento.

Mineiros que saem

mineiros que vêm

as máquinas sempre rodando.


Campeiro queimado de sol

vai ver o trabalho dos seus companheiros

nas galerias de ar frio

na noite constante!

Mineiro das minhas Gerais

você não acorda?

Vai ver o trabalho dos outros mineiros

dos mineiros-mineiros enterrados na mina

ouvindo os patrões em fala estrangeira.






As  inspirações de Fernando Sabino:

O menino escritor

Quando eu tinha 10 anos, ao narrar a um amigo uma história que havia lido, inventei para ela um fim diferente, que me parecia muito melhor. Resolvi então escrever as minhas próprias histórias.

Durante o meu curso de ginásio, fui estimulado pelo fato de ser sempre dos melhores em português e dos piores em matemática – o que, para mim, significava que eu tinha jeito para escritor.

Naquela época os programas de rádio faziam tanto sucesso quanto os de televisão hoje em dia, e uma revista do Rio, especializada em rádio, mantinha um concurso permanente de crônicas sob o título “O que pensam os rádio-ouvintes”. Eu tinha 12, 13 anos, e não pensava grande coisa, mas minha irmã Berenice me animava a concorrer, passando à máquina as minhas crônicas e mandando-as para o concurso. Mandava várias por semana, e era natural que volta e meia uma fosse premiada.

Passei a escrever crônicas policiais, influenciado pelas minhas leituras do gênero. Meu autor predileto era Edgar Wallace. Pouco depois passaria a viver sob a influência do livro mais sensacional que já li na minha vida, que foi o Winnetou de Karl May, cujas aventuras procurava imitar nos meus escritos.

A partir dos 14 anos comecei a escrever histórias “mais sérias”, com pretensão literária. Muito me ajudou, neste início de carreira, ter aprendido datilografia na velha máquina Remington do escritório de meu pai. E a mania que passei a ter de estudar gramática e conhecer bem a língua me foi bastante útil.

Mas nada se pode comparar à ajuda que recebi nesta primeira fase dos escritores de minha terra Guilhermino César, João Etienne Filho e Murilo Rubião – e, um pouco mais tarde, de Marques Rebelo e Mário de Andrade, por ocasião da publicação do meu primeiro livro, aos 18 anos.

De tudo, o mais precioso à minha formação, todavia, talvez tenha sido a amizade que me ligou desde então e pela vida afora a Hélio Pellegrino, Otto Lara Resende e Paulo Mendes Campos, tendo como inspiração comum o culto à Literatura.



VIAGEM

O destino? Cataguases.
Quero depressa chegar.
O motivo da viagem
não é segredo nenhum,
virá nas folhas de cá:
— Embarco pra Cataguases,
que lá me vão enterrar.

Por favor, façam depressa
o transporte para o chão
do meu corpo e seu fedor.
Não deixem pelo caminho
mazelas que foram minhas,
herói de infeliz amor.

Me arquivem logo no chão,
no frio barro vermelho
do outro lado do rio,
um pouco depois da ponte
(com licença do Ouvidor).

Cubram, idem, o monturo
com pedra, areia e cimento,
mas não deixem nenhum brilho,
nenhum sinal exterior
que inda aos pássaros engane,
que a visitas e coveiros,
jornalistas e parentes
recorde o silêncio escuro
em que dormindo me fique.

Depois, me larguem, me olvidem.
Que eu seja bem digerido
pelo chão de Cataguases,
reino de Minas, Brasil.

(in "Lira Coimbrã e Portulano de Lisboa",
Livraria Almedina, Lisboa 1965)



O Sangue no Plástico

Ora bem, o plástico
tem o império da geometria,
tem sua própria ciência do raro.
Quer um tempo, outro,
no impassível do espaço.Súplica

não-senso da palavra
dou-te a palavra e o senso dá-se
à palavra doce com o agro
que nos damos

foi-se o equilíbrio
na cibernética impassível

estamos
acorrentados ao possível
oh moscas de Sartre

que arte
em Paris ou confins
da Escandinávia
nos faria iberos – quero dizer
nos faria fidalgos no império onde nascemos
de tanga?

traga, Chomsky,
a Praga – Roman Jakobson
no ápice da palavra.

Um comentário:

  1. Thomas More, a Magna Carta inglesa e o nosso STF

    Amigos, vocês sabem que sou um doidivanas por história. Há pouco andei relendo sobre Thomas Morus, o lorde-chanceler do rei Henrique VIII, um tremendo intelectual católico, que morreu enforcado por ordem do seu rei por não ceder em questões de princípio. É ele o autor do livro ‘Utopia’ (aliás, muito citado pela turma da esquerda, que afirma ser o socialismo uma ‘busca da utopia humana’). Há um filme sobre ele, O Homem Que Não Vendeu Sua Alma, assistam.
    E por que o estou citando aqui?
    Quando Henrique VIII quis descartar-se de sua primeira esposa Catarina de Aragão, para então casar-se com Ana Bolena, isso por volta de 1533, ele acabou rompendo com Roma (o Papa não aceitou a anulação de seu casamento) e fundando a divergência anglicana, em ato do parlamento.
    Então o rei exigiu que todos seus súditos jurassem obediência ao rei e ao ato do parlamento, coisa que Morus não aceitou, pois não aceitava o rompimento com Roma e com a lei maior, a Carta Magna. Não que ele não amasse o seu rei, mas é que amava ainda mais sua fé católica e os princípios da Magna Carta (uma espécie de constituição não formal). A Carta Magna inglesa era, e ainda é, um sistema institucional com normas e princípios que não deveriam ser ajustados aos interesses momentâneos e particulares de um rei ou mesmo de um parlamento. E por isso, por respeito à lei maior (Carta Magna) e a sua religião, ele morreu, em 1535, depois de julgado e de não ceder um milímetro.
    Sua esposa, implorou-lhe que cedesse, que aceitasse jurar fidelidade ao rei, que a vida é o bem maior: sua resposta: ‘quantos anos tenho ainda de vida, 10, no máximo uns 20? Como abrir mão da vida eterna por esses meros 20 anos?’
    Morus, nesses tempos em que por aqui o nosso STF está diariamente reescrevendo a nossa sacra Constituição (congresso, para quê?), lembra-me Paulo Brossard de Souza Pinto, que afirmava sempre, ‘Lei boa é aquela que protege ao limite até mesmo ao nosso maior inimigo.
    Morus foi A Man For All Seasons. E Chandão e sua turma, que são?
    Triste Brasil!

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