O país das Ilicitações
Por Glauco Fonseca
As relações entre o público e o privado estão em crise no Brasil. Qualquer parceria entre os segmentos pode ser vista como se fosse um caleidoscópio. Dependendo do que se queira ver, denúncias são formuladas a bel prazer, de acordo com o tempo, a temperatura, velocidade dos ventos e espectros astrais, seja lá o que isto significa. Entrar em uma licitação já é considerado indício de intenção de crime. Ganhar, então, é a prova cabal de que há roubo de dinheiro que “poderia ir para a construção de escolas, creches, hospitais” ou qualquer coisa que os gestores públicos fingiram que fariam e jamais farão.
A corrupção no Brasil tem sido evolutiva sob todos os aspectos. A ousadia dos ilícitos é cada vez maior, tanto quanto os recursos que têm sido desviados a céu aberto. O número de pessoas envolvidas em crimes de corrupção também aumentou de modo endêmico. Não se trata mais de um fenômeno estanque ou temporário e sim de algo institucionalizado e até tolerado. O limite para o saque das burras públicas é que ainda não atingiu o seu pico. Há ainda mais espaço para roubar, mais dinheiro (que não acaba nunca) e mais criatividade em ações para fins ilícitos do que para sanar problemas históricos do país, como estradas esburacadas, educação incompleta ou saneamento precário.
A hipocrisia é crescente e se alimenta da falta de ética de uma nação inteira. Empresas que corrompem sistematicamente são, muitas vezes, as mesmas que possuem ações em bolsa, com suas contas abertas a investidores. Ou seja, praticam padrões éticos internacionalmente aceitos no campo privado e deitam e rolam nos certames públicos como se fossem “O Médico e o Monstro”. Se um dia as empresas privadas decidissem dar um basta à corrupção no setor público, atuando como se privado fosse, teríamos um golpe mortal efetivo nas ocorrências de roubo de recursos públicos. A ideia é boa.
Se partirmos da premissa de que nosso cotidiano nos leva a esquecer do “pequeno detalhe” de que só há corrupto se houver um corruptor, a junção de lideranças empresariais para a reformatação do mercado certamente renderia bons frutos. Não acabaria com o roubo, mas daria um “uppercut” letal para a maioria dos ratos de navio que se arvoraram depois dos ensinamentos do Mensalão. Isto sim seria ser “socialmente responsável”. Isto sim seria “ética empresarial” e competitividade livre de influências malignas da corrupção.
Em síntese, há um grande motor favorável às engrenagens lubrificadas da corrupção no Brasil e este motor se chama iniciativa privada inescrupulosa. Experimentem competir limpo, praticando a ética que exigem de seus empregados e fornecedores, para ver se o país não melhora, se não melhora a qualidade da interlocução, a qualidade profissional e técnica dos agentes públicos. Não há país livre de corrupção com empresários corruptos e corruptores. Não há meia ética ou ética de apenas uma via.
Fica a sugestão para um grande pacto nacional de combate à corrupção, tendo à frente não a Polícia Federal ou os agentes públicos apenas. A sugestão é de criação de um pacto pra valer. Corrupto não recebe mais dinheiro, empresário não paga mais. Assim, corrupto morre de fome e empresas incompetentes vão ter de se virar com seus destinos diante da competição séria e sem aditivos inescrupulosos.
Não há agentes públicos corruptos sem que haja empresários mais corruptos ainda.
Nenhum comentário:
Postar um comentário