Uma conversa franca
Carlos Mota
Hoje eu quero falar bem de perto contigo, meu pai.
Hoje eu quero que tu arranjes um tempo para ter tempo prá mim... Mas hoje eu não quero falar do futebol, da política, da nossa família, dos negócios, do trabalho... Hoje eu só quero falar para o meu pai... Hoje eu quero ter contigo uma conversa que há muitos anos eu gostaria de ter, mas o receio de não ser ouvido; o medo de parecer um sentimentalóide sempre impediu que eu tivesse coragem de te abrir meu coração.
Sabe, meu pai, eu ainda trago bem viva na minha lembrança as vezes em que me pegastes pela mão e me destes a segurança que eu precisava. Eu olhava pra cima e te via ali, grandão, forte, imbatível, e me orgulhava de te ver como meu herói sem capa e sem espada.
Nos momentos em que eu corria atrás da bola, me imaginando sendo um craque, era pra ti que eu olhava e através do teu olhar eu me sentia o melhor de todos. Era em tua mão, meu pai, que eu me agarrava com força, sentindo-me o mais protegido dos meninos. E na união da tua mão com a minha; na união do teu coração com o meu, eu me sentia forte, me sentia feliz, pois podia contar com a tua proteção.
Mas o tempo passou e eu cresci; aos poucos fui percebendo que eu me tornava maior e mais forte fisicamente do que tu; e passei a julgar que não precisava mais de ti; já me sentia um homem, capaz de superar sozinho qualquer obstáculo da vida.
E foi pensando assim que o menino que se sentia seguro agarrado na mão do pai, decidiu ser adulto antes da hora E por esta vida afora; uma vida em que as surpresas nem sempre são boas, foi que eu aprendi na marra o que eu poderia ter aprendido com os teus conselhos.
Mas houve um momento em que te julguei muito careta; muito conservador; muito antiquado para permitir que permanecesses cuidando de mim. Pensando que eu já pudesse sozinho cuidar de mim, foi que virei as costas para a tua proteção, sem saber que estava deixando de lado o teu amor.
Hoje te vejo meu pai, com os cabelos brancos; com as rugas a fazerem tremer tuas mãos que antes eram fortes; hoje te vejo com idade avançada, tão diferente daquele super herói da minha infância, e percebo que mesmo estando assim, castigado pelo tempo, ainda és o herói da minha vida. Faz tempo, meu pai, que eu não te abraço forte como te abraçava quando era criança; faz tempo que eu não te dou um beijo e um “upa” daqueles nossos; faz tempo que eu não digo que te amo.
Mas hoje, quando faço com meu filho o que fazias comigo, percebo que perdi muito tempo me afastando do teu carinho... Hoje eu sei que deves ter sofrido calado quando dei meu grito de independência e rompi o elo que nos unia; hoje eu sei que tinhas medo de me perder; o mesmo medo que tenho de perder o carinho do meu filho.
Por isso hoje eu quero te agradecer, meu pai, por haver me ensinado a ser feliz; te agradecer por haveres permitido que eu buscasse o meu caminho, pois sabias que mais cedo ou mais tarde eu estaria fazendo o que hoje faço, que é dizer que eu sinto saudades, meu velho, de tudo o que fazíamos quando eu ainda criança, confiava à ti toda a minha existência.
Contigo eu aprendi a ser pai e aprendendo a ser pai, eu aprendi o que todo o pai espera de um filho... Eu te amo muito, meu pai, e podes ter certeza de que por toda a minha existência eu vou carregar a alegria de ter nascido teu filho; quero dizer que hoje, mais do que nunca, continuas a ser o meu mais forte herói, sem capa e sem espada.
A emoção toma conta de mim e neste momento tudo o que eu posso dizer é obrigado, meu pai, por ter me feito feliz; obrigado por me chamar de filho.
Obrigado por me ensinar a ser um pai de verdade...
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